Qual o maior cronista vivo? Luis Fernando Verissimo. Até no mundo dos mortos, ele se daria bem. Acredito que arrebataria o vice-campeonato, ficando somente atrás de Rubem Braga. A vantagem do capixaba seria simbólica, talvez pelo saldo de gols. Os dois foram fundamentais na definição do gênero no Brasil. O primeiro construiu toda a estrutura da crônica, diferenciando o texto leve e lírico do conto; o segundo confundiu tudo, aproximando a crônica novamente do conto com o uso perfeito dos diálogos.
E de quem sou interino? Luis Fernando Verissimo. Ao receber cumprimentos pela substituição, sempre penso que são pêsames. Minha culpa é explicar:
– Logo Luis Fernando volta, meu trabalho é aumentar a saudade dele.
Vejo que o jornal Zero Hora se dispõe a destruir minha carreira. Não há como sobreviver a sua interinidade. Mesmo que tocasse clarinete nas horas vagas e criasse um Jazz 7.
Ainda por cima, sou uma matraca, correndo graves riscos de dizer bobagem. Verissimo é o contrário: contido. Suas palestras são mímicas, dispensam a tradução para Libras. Os amigos falam por ele e ele retribui escrevendo pelos amigos. Um negócio perfeito.
Emudeci nos momentos em que abracei o autor. Permaneço quieto, e ele, quieto. É possível ouvir nossa respiração soletrada. Um repete o outro. Tudo bem? Tudo bem. Céu azul? Céu azul. Ele não sofre com o desespero. Não é problema de falta de assunto, é temperamento. Encontrar-se com Verissimo é entrar no elevador: ninguém solta um pio. É ter a solidão reembolsada com juros.
Ansioso, faço loucuras para romper o nervosismo, inclusive confessar os pecados. Como ele é célebre pela sua timidez, qualquer timidez em sua frente é uma imitação. Para ele, aquilo é rotina; para mim, é mal-estar. Praticamente impossível ser inteligente ao lado de um homem quieto.
Como não conseguirei vencê-lo na escrita, decidi superá-lo no silêncio. Precisava de muito treino. Experimentei dois dias longe de minha voz. Os filhos não compreendiam, sondavam que virei Hare Krishna. Não atendi telefone, e almocei e jantei calado.
Quando calculei que estava pronto, fui ao combate. Empreguei golpes baixos como piscar e pigarrear. Quase bati palmas perto de seus cílios. Ele se conservava imutável. Não mexia os braços e os lábios.
Uma hora e meia de completa meditação, e desisti, perguntei se tinha um lenço para secar o suor. Ele me alcançou do bolso de trás da calça. E, sem piedade, o cretino não proferiu nenhuma palavra de consolo. Não posso brincar de estátua com quem já é uma.
Publicado no jornal Zero Hora
Interino de Luis Fernando Verissimo, p. 2, 21/10/2010
Porto Alegre (RS), Edição N° 16495
33 comentários:
É, competir com Luis Fernando Veríssimo foi um ato de coragem, sendo na escrita ou na (falta de) fala. Mas não se acanhe, você também é um ótimo escritor e quem sabe daqui a algum tempo, você também não será " Veríssimo" da vez.
Comecei a ler o blog recentemente, adorei!
;)
Ele é ma-ra-vi-lho-so! Eu simplesmente sou fã desse cara! Ele pega a veia do humor de um jeito sem igual! Dá vontade de ler, reler, ler de novo e não parar mais! As piadas são sempre engraçadas, as críticas sempre atuais e a visão de mundo sempre verdadeiramente fantástica!
Ele é um cara que merece semrpe ser lembrado!
Perfeita descrição do Veríssimo, perfeita a sua forma de escrever. Pelo que vejo, são opostos um ao outro no estilo de vida e de escrita, mas têm algo em comum: escrevem textos encantadores.
;)
Pois,para mim, pode mandar a modéstia às favas. Você é muito bom também e será tanto quanto ele, quanto mais sua idade for se aproximando da dele. Os anos de estrada a mais que ele possui também devem ser levados em conta. Portanto, você já está inscrito na história da literatura. Meu abraço. Paz e bem.
Descrição perfeita de Verissimo! Impossivel concorrer com o mestre mesmo.
sou fã assumiiiiiiiiiida,sua e de Verissimo (:
Excelente, seu texto! Vc tb é dez! Sorte nossa que temos os dois!!
Adoro o Veríssimo e me diverti muito lendo esta crônica. Realmente brincar de estátua com uma é covardia.
Concordo em gênero, número e grau sobre o talento do Veríssimo! Ele é sensacional!!
Sou fã assumida. Dele e sua.
E quem disse que ser falastrão não é um "estilo"? Tal qual o é ser "estátua"... Viva às diferenças!
http://omundoparachamardemeu.blogspot.com/
Sou leitora do Veríssimo, mas cada um tem seu espaço. Você é grande!
beijos
Como uma vez disse o professor Sócrates numa discussão sobre quem era melhor, Maradona ou Pelé, ele respondeu sabiamente: "nenhum dos dois...as pessoas não são comparáveis". Assim, obviamente Veríssimo tem sua genialidade e você também. No meu caso, sou leitora assídua de ambos, e jamais substituiria um pelo outro. A intenção é sempre somar.
Fabrício,
Um dia intentei disputa parecida. Ei-la:
O MAIOR POETA BRASILEIRO VIVO
O maior poeta brasileiro vivo, sou eu.
Pasmem, não é Ferreira Gullar.
Os meus poemas são mais sujos que os dele,
Minha poesia (ao computador) exprime
Mais vanguarda que os galos de outrora dele.
Minhas rimas que não rimam com nada
Inventam melhor não haver uma estrada
Onde passem versos em vez de bois
A caminho de matadouros, ou de meu estômago
Vazio...
O maior poeta brasileiro vivo, não sou eu.
Grasnem, deve ser mesmo Ferreira Gullar.
Os meus poemas são menos límpidos que os dele,
A minha poesia (ao computador) exprime
Menos vanguarda que os galos já antigos dele.
Minhas rimas primas convertem menos lágrimas
Dos olhos de minha amada do que as dele,
Dos olhos da amada dele...
O maior poeta brasileiro vivo, é Ledo Ivo.
(Pedro Ramúcio)
*
Parabéns pelo espaço. Aqui, grandes sacadas sempre: coisas de quem entende do riscado.
Abraço mineiro,
Pedro Ramúcio.
"Praticamente impossível ser inteligente ao lado de um homem quieto."
Vc tem umas sacadas brilhantes!
+ 1 tiete sua = eu.
Eu gostava mais do seu outro blog, vc falava mais sobre as coisas do coração, dos relacionamentos...era um mestre pra mim...sempre estou por lá ...sempre aprendendo alguma coisa.
Bem que vc poderia voltar a ser o que era antes, eu acho que vc está amando , não está sofrendo e nem está apaixonado, vc setá seguro demais.
Sinto muito por mim!
Beijos.
Cada um com seu estilo e diferenças. O que importa é saber se utilizar da arte da escrita.
Ótima crônica.
Abraço.
Excelente texto.
Verissimo é Verissimo sempre, e ninguém, nunca, jamais, tomará o lugar dele.
Mas os apreciadores de uma boa leitura, estou certa, já reservaram um lugar que é seu, só seu. Ao qual também, ninguém jamais tirará.
Beijos da Ori.
Duelo de gigantes. Gostaria de ver ele escrevendo sobre você. Um embate e tanto. Parabéns pelo texto.
Adoro Veríssimo...mas você também encanta,,e me encanta desde que te vi no Jô..
Beijocas
Sua crônica é um belo chiste...(pela definição freudiana)
Uma maneira bem-humorada de lidar com algo quase que insuportável.
Gosto dos dois.
:)
Adoro Luis F. Verissimo!
Juro que não sabia que "ao vivo e a cores" ele era tão tímido.
Deve ser porque uma de suas maiores qualidades é a de observador. O cara é o máximo nisso.
Quem já leu obras dele, ou mesmo partes sabe muito beem disso
abraços
http://repensandoaqui.blogspot.com
eu ia amar se vc lesse: http://osolmeinspira.blogspot.com/2010/10/meus-amores-literarios.html
Cada um tem sua estrela e luz próprias! Gosto dos dois. E mais: o Braga era o cara! =D
Interessante, Fabro, o tímido que se esforça para falar, e o tímido que não vê problema algum em permanecer calado. Sou tímido, às vezes, quando calado, me sinto confortável em público, mas às vezes sinto que preciso dizer algo. Sorte sua presenciar o silêncio de alguém tão notável à medida que você se torna cada vez mais uma notoriedade, amigo.
Abraço do Jefhcardoso de Ituverava, pertim de Ribeirão Preto, uai.
Parabéns Fabro!!!
Muitas felicidades e luz em sua vida! Um grande presente para mim ser do mesmo dia q vc!!! bom compartilhar!!!
bjos de sua fã de já algum tempo...
ah, gosto do Veríssimo, mas ADORO vc!!!
Meu amigo,
Tive o prazer de ler está crônica no Jornal ZH em folha. Belo!
Mas meu parabéns por mais um ano de vida e de crônicas!
Abs e saudades!!!
Sadi
Carpinejar, gostaria de te abraçar todos os dias, um para cada frase que escreves, caso te conhecesse.
Mas hoje seria um dia para solenidades maiores e lhe desejaria muitos anos a mais de textos, mais que a vida.
Meus parabéns.
Veríssimo encanta ! Textos inteligentes. Diretos . Concisos. Um escritor é bom quando sentimos prazer na leitura.
Estou conhecendo seus textos também e adorando.
Parabéns .
Abs
Veríssimo é o cara? Tá todo mundo doido. To vendo que o nível do blog baixou... EU sou o cara rsrs
Poxa fabro, essa lambida de saco que você deu tá competindo com desempenho de atriz famosa de filme pornô...
É daquelas que você começa passando a língua no chão, virando os olhinhos pra cima e termina na ponta da orelha.
Então, para de tentar fazer o Veríssimo aceitar a sua puxada de saco que não vai adiantar. Vocês são concorrentes, NÂO tem jeito.
corrigindo - PARE A SUA.
BARULHO
by Ramiro Conceição
Quando vem o silêncio que quase mata,
deixando-me parecido qual uma estátua,
faço logo algum barulho pra ver se passa
essa burrice intermitente que ‘mi’ ameaça.
O DOUTO APEDEUTA
by Ramiro Conceição
E se o desprezível – espantalho – soubesse dos poemas
do saci-pererê? E se amasse os passarinhos que ele vê?
Será que o homem não seria - a humanidade que se crê?
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