terça-feira, 18 de outubro de 2011

QUER NAMORAR?

Arte de Raoul Hausmann

A melhor agência de namoro é comprar uma passagem para bem longe.

Quanto mais longe, maior a chance de ser feliz. Não precisa usar o bilhete, é adquirir, pôr no bolso e andar com aquele olhar irresistível de janela redonda de avião.

Sempre repercute: todo mundo sente que vamos embora e ganhamos importância amorosa. Mais imbatível do que usar aliança, do que borrifar perfume de boto, do que afogar estátua de Santo Antônio.

Quer se apaixonar? Invente uma viagem. Mas tem que pagar para fazer efeito. O destino confere os depósitos bancários.

A despedida é um afrodisíaco veemente. Ficamos abertos e receptivos ao acaso.

Durante os veraneios da adolescência, em Rainha do Mar, eu me ligava na menina no último dia de férias, quando era condenado a voltar para a Capital. Amiga do Interior confessava que me amava um pouco antes de entrar no carro cheio de malas e tralhas. Dava um selinho, corria em direção aos pais e trocávamos cartas ansiosas pelo reencontro ao longo do ano.

É ter um compromisso certo e inadiável para arrumar uma paixão. Sem antítese, não há dialética, não se chega à síntese.

Adoramos uma encruzilhada, confusão, dúvidas. Adoramos a ambiguidade do aceno, que pode ser um oi e um tchau.

Ao tomar um caminho, surge outra opção até então invisível. É programar um intercâmbio no Exterior, que nos envolveremos na noite anterior ao embarque. É realizar sonho profissional de trabalhar na Europa, que antigo amor vem suplicar reconciliação.

O aeroporto e a rodoviária são altares, cupidos, balcões de suspiros.

Se você é solteiro, não entre em chats, não crie perfis falsos, não perca tempo.

As mulheres são alucinadas por homens com malas. Os homens são alucinados por mulheres atravessando o detector de metais.

Se não consegue namorado/namorada, gire o globo, pare um país com o dedo e arrebate passagens.

A distância influencia a longevidade da relação. Menos de 200 quilômetros não traz cócegas. O arrebatamento é proporcional à quilometragem. Viajar a Espumoso produzirá um rápido olhar 43, Santo Ângelo resultará em flerte, Rio de Janeiro ocasionará um caso, Natal renderá breve namoro, deslocamento ao Acre talvez pinte noivado.

Mas, para casar com véu e grinalda, aposte alto e compre passagem de ida (somente de ida!) a Bangladesh.



Publicado no jornal Zero Hora
Coluna semanal, p. 2, 18/10/2011
Porto Alegre (RS), Edição N° 16859

46 comentários:

  1. Muito bom, Carpinejar. Vou comprar a minha agora para Bangkok. :D

    ResponderExcluir
  2. Aí, meninas, to com viagem marcada pra Hong Kong pra sexta-feira! Aproveitem! x) Muito bom, seu Fabrício!

    ResponderExcluir
  3. Ótimo texto! Os acomodados que me perdoem, mas movimento é fundamental, rs. ;-)

    ResponderExcluir
  4. Muito verdade, mesmo que isso nunca tenha acontecido comigo, kkk.

    ResponderExcluir
  5. Não quero ser feliz longe,
    quero a felicidade aqui,
    sem passagem nem hora marcada.

    ResponderExcluir
  6. Viajando com seu texto, estava lhe observando...vendo suas ações, sua atidude e meu coração acelerado, sentia sua insegurança juvenil, sua euforia e também um ar de "platonismo" . Mas, ao final retornei com um longo sorriso e "sonoro" suspiro. Olhei para minha serena realidade. Ah! Foi linda minha travessia. Mas estou feliz com meu "momento".
    -Sinceramente, vervedirlass. (verve, por pretensão).

    ResponderExcluir
  7. Assino embaixo da sua teoria, Fabrício.
    Já namorei há distância 4 vezes, namoros começados assim, em despedidas. hehe.

    Mas, mesmo o mais distante dos namorados, não virou marido. Um oceano entre nós não foi o bastante para tal. rs

    ResponderExcluir
  8. Conheci meu marido através do seu blog Fabro, entre idas e vindas nos aeroportos de Poa e Goiânia acabei mudando para cá, casando e hoje espero nosso primeiro filhote.Bjo grande!

    ResponderExcluir
  9. é isso aí, mulherada, comprando passagem, vou em seguidinha... ;)
    se o garimpo não funcionar, vou para a turquia... se não me achar, me perco de faceira.

    ResponderExcluir
  10. Carpinejar tô bem fã das suas escritas..achei o blog por acaso na rede..e desde então tenho acompanhado diariamente...Destino definido...que venha o amor rsrsrsrs

    ResponderExcluir
  11. Perfeito Carpinejar, não cheguei comprar nenhum bilhete, o que comprei foi um esqueleto, onde montei o homem perfeito, pra completar só faltava os traços do rosto, nunca conseguia encaixar as peças...talvez na incerteza de que era fantasia da minha cabeça...precisei esperar uma longa tempestade passar, atravessei vários oceanos e o homem perfeito estava do meu lado e nunca tinha dado importância...foram 16 anos até eu notar sua presença e acreditar o que havia profetizado pra mim mesma...a descoberta foi em um sonho... hoje estamos casados a dois anos... e creio que realmente o homem perfeito existe, é real.

    Abraços, gostei do seu blog, quero conhecer mais e estarei por aqui mais vezes.

    Giovanna

    ResponderExcluir
  12. Comprando passagens pro México jááá! haha Parabéns, lindo texto!

    ResponderExcluir
  13. Pitadas apimentadas de realismo!
    Menos de 200 quilômetros não traz cócegas? O Amor da Minha Vida mora a mais de 4 mil km (Recife, eu - Santa Vitória do Palmar, ele) e espero adquirir a passagem só de ida, pois a volta é um desmanchar de prazeres, um atestado de loucura. :(

    Carpinejar, você sempre escreve o que nós gostaríamos de ter escrito.
    Obrigada por nos presentear com suas letras.
    Abraços...

    ResponderExcluir
  14. Texto alegre, interessante e muito verdadeiro... Viajar traz a licença para a abertura, para a chegada do novo...
    Muito bom!!!

    ResponderExcluir
  15. Como de costume, excelente texto! Dá para fazer um "link" com "Te Espero!", de Borralheiro.

    ResponderExcluir
  16. Ai, ai, suas teorias são geniais. E que observações!!! Vai ter muita gente dizendo que vai pra Bagdá ou coisa parecida (risos)!

    ResponderExcluir
  17. Muito bom o texto,pena ter me lembrado de idas que não se consubstanciaram em voltas, e de voltas que preferira que fossem apenas idas. É a antítese de sermos humanos!

    ResponderExcluir
  18. Fantástico. Bem humorada e realista. Adorei. Uma das mais bem escritas crônicas suas. Beijo grande.

    ResponderExcluir
  19. Adorei o texto, realmente um dos melhores. Por problemas pessoais tive q desmarcar uma viagem, mas pretendo realizá-la brevemente. E será por aki mesmo, onde encontra-se MAV... rsrsrsrsrs

    ResponderExcluir
  20. BRASILMIX LIVROS USADOS - SEBO E LIVRARIA VIRTUAL

    Livros novos * Livros usados * Livros esgotados * Utiliza Pagamento Digital com garantia de entrega para todo Brasil



    Visite www.brasilmix.com.br

    ResponderExcluir
  21. o gostoso disso tudo
    é que se der muito errado
    ainda me resta um destino!

    bela ideia...

    :)

    ResponderExcluir
  22. Este comentário foi removido pelo autor.

    ResponderExcluir
  23. A saideira é desculpa pra querer ver, e quando estamos com passagem marcada, acontece mais rápida, intensa e sem racionalizarmos.

    A passagem marcada nos dá calafrios, só de imaginar que iremos sentir saudade da pessoa que embarca. O tempo, pra quem viaja passa rapidinho, diferente do tempo arrastado de quem espera o possível retorno.

    A passagem marcada é um desespero pra quem ama, pois temos a sensação de perda, a pessoa querida poderá encontrar algo mais interessante na América do Norte.

    É também um desafio. Nos sentimos na missão de dar razões para o que viajante não abandone a terra natal, e, consequentemente, nós!

    Ter uma passagem marcada é tão trágico como estar no Reveillon de 1999, quando acreditávamos que o mundo iria se acabar naquele ano ou estar em estado terminal...na véspera da partida, queremos fazer tudo o que não fizemos.

    ResponderExcluir
  24. A incerteza da volta imediatiza o encontro.

    Ótimo texto. Típica fresta por onde só olham pequenos grandes olhos.

    Quando puder, dê um pulo lá na minha laje. Meu último texto diz "Ser adulto é coisa de velho".

    http://devaneiosedescaramentos.blogspot.com/2011/09/ser-adulto-e-coisa-de-velho.html

    Saudações.

    ResponderExcluir
  25. Quero!
    Tenho uma passagem à Atlândida...



    A LESMA
    by Ramiro Conceição


    Sou lento… muito lento…
    pensando-sentindo tudo!
    Uma pedra, para mim,
    é um Pão de Açúcar,
    uma palavra, uma odisseia.
    Sim… sou uma lesma
    fantasiada de homem.

    Não sei como fabrico poemas.
    Devo ser uma lesma… alada,
    um bicho-papão em mutação,
    uma espécie de dragão, muito gosmento,
    a ser colado na imaginação das crianças.

    De início, fui uma lesma católica;
    depois, tornei-me uma marxista;
    freudiana; nietzscheana; reichana;
    e, hoje, sou uma lesma quase feliz:
    uma espécie de catassol aprendiz,
    que ama navios perfumados a mar.

    É, agora estou literalmente a ver navios,
    que sabem…: a tristeza ou a felicidade
    são migratórios pássaros de passagem.

    Embora lenta… a sabedoria da minha lesma
    ensinou-me que tudo é rápido, muito rápido,
    que o relevante não é a distância percorrida,
    porém a profundidade e a altura do calado à
    geração de rastros, na busca de longínquos.

    Melhor do que um milhão de beijos: um único dado.
    Melhor que um milhão de olhares: um único amado.
    Melhor que uma biblioteca inteira: um poema alado.

    Sim,
    meu relógio são relâmpagos:
    a hora exata dos vaga-lumes,
    das araras… e das maritacas!

    ResponderExcluir
  26. é óbvio que é Atlântida

    ResponderExcluir
  27. kkkk... para Natal/RN é Fabricio? sei..kkkk
    então vamos testar ir ao outro lado oposto do país..rsrs

    ResponderExcluir
  28. Acredito muito nisso. É impressionante o quanto é real. Hahaha.
    Muito bom (só pra variar,né? rs)

    ResponderExcluir
  29. E quem já namorou a 3789km (Recife)?


    **risos**

    Abraços!

    Sadi

    ResponderExcluir
  30. Carpinejar, seu lindo...
    Te sigo no twitter (acho que você também me segue - @cronistaamadora, prazer), mas nunca vim aqui.
    Tenho medo dessa interpretação que você faz de mim.
    Mil abraços e obrigada.

    ResponderExcluir
  31. Ou seja... seja rico, tenha dinheiro para poder comprar passagens!

    ResponderExcluir
  32. Muito legal, cara! Minha primeira visita ao blog, gostei mt do texto!

    ResponderExcluir
  33. Adorei! Estou indo a Machu Picchu amanhã e passsei por essa situação hoje. Andava ao som do vento por Lima, pensando o que poderia me fazer melhor fora uma grande aventura e me deparei com proposta encantadora. Lembrei da postagem e lembrei que só podemos conduzir aquilo que podemos dar nome e, com certeza, para estar aberto é preciso estar sempre predisposto a deixar acontecer...

    ResponderExcluir
  34. Ótimo texto, serviu pra mim, fiquei com uma vontade danada de ir para Bora Bora.

    Mas como não tenho dinheiro, vou ver se resolve dar uma voltinha até a rodoviária Tietê.
    hahaha

    ResponderExcluir
  35. Adorei o texto, parabéns ele é perfeito, gostoso de ler, enquanto ia descendo as linhas, um sorriso se abriu, e veio uma enxurrada de lembranças, e só pra constar, há quatro anos atrás quando mudei de cidade, encontrei o amor da minha vida....

    ResponderExcluir
  36. Ótimo texto!! Acho que vou fazer uma viagem nos próximos dias, hehehe!

    ResponderExcluir
  37. Este comentário foi removido pelo autor.

    ResponderExcluir
  38. E aqueles que se encontram em uma cidade sendo ambos externos de terras não similar, confluindo apenas eu suas discrepâncias constantes, a distância da viagem do outro um aumenta a de cada um.

    ResponderExcluir
  39. Aconteceu comigo: passei no vestibular em outro estado e lá vem meu amorzinho voltando, e pra ficar. Não ficou, mas tentar foi i-r-r-e-s-i-s-t-i-v-e-l. Adoro me encontrar nos teus textos Fabricio!

    ResponderExcluir
  40. ah tá muito obrigada ajudou pacas!
    Hoje mesmo me mudo pra outro planeta que é pra ter certeza de que vai rolar algo de legal!

    ResponderExcluir
  41. Conheci o amor da minha vida a quatro meses de um intercâmbio de um ano e meio.
    O amor durou (dura) e o intercâmbio encurtou-se.

    Sou a prova viva da sua teoria, risos.

    ResponderExcluir