domingo, 3 de janeiro de 2016

CORNO MANSO, MANSINHO



Contar ou não contar que o seu xará de trago e ressaca está sendo traído? - eis o maior dilema da amizade. Antecipar o pior ou deixar o pior acontecer? Melhor ser um corno pontual ou um corno retardatário? Há diferença em desvendar a infidelidade antes ou depois? A antecipação diminui o estrago? O colega que não fala que viu a traição estará quebrando o voto de lealdade?

Quantas dúvidas numa só questão.

Meu amigo telefonou desesperado:

- Você está com a sua mulher aí ao seu lado?
- Não, ela está viajando. Por quê?
- Pois é, difícil a situação, não sei se deveria contar. Mas não posso lhe ver sofrer e ser enganado. Pensei duas vezes antes de ligar...
- O que foi?
- Acabei de passar pela calçada da fama em Gramado. Ah..deixa pra lá!
- Desembucha meu!
- Vi a tua esposa abraçada a um cara, andando abraçada a um cara, em plena luz do sol, nem aí para a multidão! Muito descaramento. Desculpa, meu velho, não queria ser o portador desta notícia.
- Não precisa se desculpar.
- Uma vaca, cara, não merece isto!
- Calma, calma, como era ele?
- Sua altura, barba cerrada, cerca de 50 anos, cabelos pretos...
- Ele está de jaqueta de couro, jeans e bota?
- Sim.
- Previsível. A minha mulher se amarra no estilo selvagem da motocicleta.
- Bah, que m.! Não fala assim que choro.
- Ele não vive rindo?
- Sim, parece muito feliz.
- Ele não está com Ray Ban?
- Como que descobriu?
- Cara, imagino quem seja...
- Você já estava desconfiado?
- Faço terapia, tem coisas que não tem como suportar sozinho.
- Você aceita que ela saia com um outro?
- Meu irmão, o que posso fazer? Impossível competir com ele. É batalha perdida. Ele é o homem da vida dela, serei sempre o segundo.
- Como assim, velho? Enlouqueceu? Agora deu para ser corno manso?
- Nada a ver, é que conheço as minhas limitações!
- Não vai fazer nada? Nenhum barraco, não mandará a vadia embora?
- Ela não é vadia, é a mulher que amo.
- Recebe um par de chifres e ainda defende a traidora? Não estou lhe reconhecendo, velho, precisa ser internado. Pirou na batatinha.
- Estou conformado. Há coisas que não há como mudar na vida.
- Não acredito que tem sangue de barata.
- Faz um favor, então, para mim?
- Faço!
- Volta lá, cumprimenta a minha mulher e dá um recado para ela.
- Pode deixar comigo! Ela vai ver com quem se meteu...O que falo?
- Diz para ela aproveitar o passeio com o seu pai e avisa que venho morrendo de saudade.

Publicado no jornal Zero Hora
Revista Donna, p. 28
Porto Alegre (RS), 3/01/2016 Edição N°18405

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