domingo, 10 de abril de 2016
SANTINHO DO AMOR
Todos podem copiar imagens das redes sociais ou baixar álbuns inteiros em segundos, mas o amor ainda permanece artesanato.
A facilidade digital não mudou os símbolos do romance, que seguem os mesmos de nossos bisavós. A rosa continua como a favorita do buquê, o bilhete continua escrito à mão, a dedicatória no primeiro livro emociona mais que o conteúdo da obra, a letra de uma canção repassada ao papel revela momentos a dois.
Se alguém pedir para ver como é a minha namorada, não mostrarei foto nenhuma de meu celular.
Para a surpresa dos outros, abrirei lentamente a carteira e retirarei uma fotinho 3x4 que recebi dela.
A tradição é transgressora no campo emocional. Não há maior demonstração de compromisso do que guardar uma foto 3x4 na carteira dentro daquele envelopinho azul de plástico. Nada aplaca a materialidade desta declaração antiga e sempre atual.
A foto 3X4 é o santinho da intimidade do casal, é o RG da paixão, é o CPF da lealdade.
Supera em importância o status de relacionamento no Facebook. Ultrapassa o valor de uma aliança no dedo.
Os pares que trocam as pequenas fotos não vão se separar sem resistência. Tiveram o trabalho de visitar um estúdio, sentar na cadeira alta e atender às ordens de seriedade do fotógrafo. Reservaram uma das cópias para a sua companhia predileta. Não é pouca coisa em tempos tão líquidos, quando o desprendimento vem sendo desculpa da preguiça.
Quando a minha namorada me presentou com a sua fotinho estava simbolicamente afirmando que confiava em mim, recomendando para que cuidasse de nossos laços e lembrasse de onde venho e para quem eu volto. Logo tornou-se um talismã da ternura, um escapulário de bolso.
Representa o atestado de nascimento de nossa relação que valerá enquanto não nos casamos, assim como a certidão de nascimento é o documento provisório antes da identidade.
E o mais bonito da foto é que ela não está rindo, ninguém ri em foto 3X4 - é o amor que gargalha de orgulho em meus dedos sempre que digo que somos apaixonados.
Publicado no jornal Zero Hora
Caderno Donna p. 30
Porto Alegre, 9 e 10 abril de 2016.
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Um comentário:
Concordo, absolutamente! Admiro sua delicadeza, abraço
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