A minha mãe não queria que lavássemos os cabelos todo dia. Não havia jeito de argumentar que era homem. Ela alegava que o cabelo iria cair (caiu do mesmo jeito, mãe!).
Sempre fui adepto, desde pequeno, de sair de banho tomado. Não gostava da sensação de ir para a aula com cheiro de cobertor. A água lavava os sonhos, acordava a pele, o perfume terminava sendo outro, mais inédito e duradouro.
Sem banho de manhã, as remelas venciam a guerra dos olhos, o suor azedava ao meio-dia e vestia o uniforme como uma incômoda fronha, com gosto de dormido.
Tinha que ser dia sim, dia não. E a mãe vinha oferecer uma touca transparente para pôr na cabeça.
– Assim não molha o cabelo!
Não sei o que a touca pode influenciar na sexualidade dos meninos, mas boa coisa não traz. Para um guri em formação, com os pelos surgindo e a voz mudando, a touca significa a coroa de uma drag queen. O apogeu do ridículo.
Acredito que uma mulher até salve o adereço com o seu charme, porém a touca no tronco masculino é uma aberração de plástico. É uma camisinha de Golias. É uma fantasia de Carnaval mais do que uma proteção. É servir a carapuça da extravagância, o capacete da afeminação.
A touca é o equivalente a experimentar um sutiã e uma calcinha. É despentear uma peruca.
Tem uma assinatura excessivamente teatral.
Nada contra botar a prevenção em cozinha ou hospital, mas daí estaria vestido e descontaria a sua afetação. O problema é a nudez com a touca. Não tem como ser levado a sério. Seremos alienígenas, a comicidade esvazia a seriedade do corpo nu.
Lembrei da touca quando um amigo me confessou que usa com a sua mulher na banheira. Como pode ainda se desejarem depois dessa visão suicida?
Publicado no jornal Zero Hora
Coluna semanal, p. 4
22/03/2016, Edição 18479
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