A paixão pelo jogo do treinador da seleção brasileira de bocha Valmir contagiou o filho Pietro e outros familiares. Fotos de Jean Schwarz.
A bocha é o esporte mais democrático que existe. Permite barriguinha de cerveja, pode ser feito depois do almoço, ajuda a digestão, integra famílias, não tem restrições a sexo, idade e condicionamento, serve para duelos e disputas em equipes, é barato e recomendado para prevenir problemas de memória (superior, inclusive, às palavras cruzadas).
Carlos Barbosa, a 97 quilômetros da capital gaúcha, é a que tem melhor aproveitado seus efeitos curativos com 40 canchas espalhadas pela cidade. Ao lado do futebol de salão, o jogo vem dividindo a preferência dos 24 mil moradores.
O município serrano é a terra do treinador da seleção brasileira de bocha, Valmir Danieli, 51 anos, que recruta atletas de Mato Grosso a Santa Catarina, em viagens trimestrais pelo país.
– Vejo quais são os jogadores de ponta e trago para se preparar na minha cidade – diz Valmir.
Carlos Barbosa também foi sede em outubro do 8º Mundial de Bocha, que reuniu 15 clubes de 14 paí-ses durante uma semana (de 9 a 16 de outubro), no bairro Santo Antonio de Castro. O campeonato recebeu público fervoroso de 11 mil pessoas e teve transmissão das finais pela RAI. Mesmo sem conquistar o primeiro lugar, que ficou com os italianos de Treviso (Clube Monastier), os gaúchos fizeram bonito com o segundo degrau do pódio, alcançado pelo Clube Três Lagoas de Garibaldi, e o terceiro degrau, destinado à equipe barbosense de Valmir, Associação Braço Forte.
Valmir encarna o espírito bocheiro no Estado. Não pensa em outro trabalho que não tenha a dimensão de 27 metros de comprimento e quatro metros de largura. Contagiou a parentada inteira a participar da obsessão. Um dos seus filhos, Pietro Daniel, 14 anos, é vice-campeão mundial na categoria infanto-juvenil, em decisão que ocorreu neste ano em Ancara, na Turquia. Sua mulher, Mariza, é campeã gaúcha de duplas. O pai, Honório, obteve o segundo lugar do Estadual em 1972 e continua a bochar com talento e sabedoria, aos 81 anos. Todos atuam juntos no final de semana. As brigas e diferenças são resolvidas no bolim.
– É o esporte de maior longevidade do mundo, para ser praticado dos nove aos 90 anos. Não é como o futebol, que tem vida curta, de duas décadas e meia no máximo – explica Valmir.
– Minha aposentadoria será a morte – exagera Pietro, que treina quatro horas por dia.
O agricultor Dorvalino Zarpelon, 69 anos, o Canhoto, partilha o fanatismo pelos corredores de carpete. Corpulento, bigodudo, é um bochófilo típico. Ou está jogando ou opinando sobre o jogo dos outros. Dono do cetro regional dos veteranos, iniciou cedo a vocação. Ainda piá, antes da escola, fugia da lavoura para exercitar a força de seus arremessos com pedras.
– Não sei se minha vida melhorou com a bocha, sei que ela não piorou – ri.
Composta apenas de três movimentos básicos (ponto, bate e raffa), a bocha é o equivalente a um xadrez em terceira dimensão, talhado a quem tem sangue-frio e talento conspiratório.
– Ninguém pretende sair jogando, porque o placar consiste em desfazer o que o adversário construiu. Em nenhum outro lugar tem tanto sentido a expressão “Calcanhar de Aquiles”, o negócio é descobrir e cutucar a fraqueza alheia – explica Valmir.
Além da aparência de roda animada, na intimidade das regras, é uma competição de malícia e intriga, de alta precisão e raciocínio rápido.
– A amizade necessita suportar as inúmeras traições do oponente. É um golpe de Estado atrás do outro. Exige concentração e astúcia, e não desistir e não se intimidar com a desvantagem.
O treinador percebe que a cancha converte os sentimentos ruins em graça e brincadeira.
– Aceita-se a condição provisória de um lance, por mais espetacular que seja. A vida segue com seus defeitos e dificuldades, entende?
Eduardo Mattuela, 17 anos, integrante do selecionado juvenil, realmente entendeu o recado. Deixou de reclamar do isolamento em casa e aderiu à embriaguez coletiva.
– Meu pai nunca estava perto, a bocha era uma espécie de bar. Passei a jogar para estar com ele. Hoje, tutto bene, sou viciado igual.
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Publicado no jornal Zero Hora
Série semanal BELEZA INTERIOR
(Em todos sábados de 2011, apresentarei meu olhar diferenciado sobre as cidades, as pessoas e os costumes do RS)
p. 32, 22/10/2011
Porto Alegre, Edição N° 16863
Conheça Carlos Barbosa, a sede mundial da bocha.
Série semanal BELEZA INTERIOR
(Em todos sábados de 2011, apresentarei meu olhar diferenciado sobre as cidades, as pessoas e os costumes do RS)
p. 32, 22/10/2011
Porto Alegre, Edição N° 16863
Conheça Carlos Barbosa, a sede mundial da bocha.
4 comentários:
Pois é, aqui onde estou não vejo bochas... bateu saudade do sul...
Quando criança, era comum ver homens de todas as idades, jogando bocha, acompanhados de alta temperatura alcólica e solar. Voltava correndo pra casa e contar a novidade, homens brigando com público incentivador. Isso acontecia nos finais de semana em um "terreno baldio", próximo de casa. Quando íamos, primas e amigas. Depois na adolescencia jogávamos com nossos pais, em um clube de funcionários...
-Sinceramente, vervedirlass.
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Parabéns!! E adorei isto: " liberdade na vida é ter um amor para se prender"!! :)) É vero.
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