Arte de Gina Pellón
Eu compactuo com extremismos emocionais. O amor é extremista. O amor é tudo ou nada, é muita briga, é muita declaração, é muito do muito.
Só confio em parcelamento de contas, jamais em crediário do sentimento. No amor, pago mais do que à vista, faço questão de pagar adiantado.
Se, no meio da transa, minha mulher diz que deseja ter um filho comigo, fico ainda mais excitado. Não vou broxar, não vou puxar discussão, não vou sair de perto, não vou entender como uma loucura. O pedido intensifica o arrebatamento, acelera as pernas, redobra o fôlego.
A frase é meu afrodisíaco, meu Viagra, meu Nirvana. Estalo os ossos das costas, estreio a boca.
“Quero um filho contigo” é um apelo para perder as reservas, os pudores, os medos; é quando o casal atinge a fé no relacionamento, é quando a esperança deixa de incomodar, quando os dois são um só e não fingem bom senso.
Não vejo nenhum problema em ter mais crianças, se posso sustentar e cuidar. Para mim, o futuro nunca foi um adiamento, o futuro é um convite.
Devo ser estranho, realmente um tipo incurável. Adoro quando minha mulher me confidencia no ouvido que deseja um filho comigo. É mais do que eu te amo, é eu te amo agora e também te amarei depois em nosso filho.
Nosso cheiro muda com a promessa, o corpo se incendeia, as palavras ganham ênfase, a respiração rejeita a paz.
Devo ser muito tolo e romântico, porém não me enervo com a súplica, eu me entrego ainda mais. Não sou um homem preventivo, que deixa de viver para evitar o pior. Vivo o dobro para chamar o melhor.
Tenho uma única vida para acertar, e há pouco tempo. Tenho uma imensa paixão pela minha mulher, e há pouco tempo.
Meus amigos me qualificam de burro, que eu precisava ser mais cauteloso, que peco pela ansiedade, que tomo decisões sem avaliar as consequências, que filho é uma trabalheira, que é sinônimo de privação e responsabilidade, que é para ir com calma na relação. Mas quem ama já prevendo pensão merece mesmo se separar.
Troco os pés pelas mãos de propósito, para segurar o amor com firmeza. Eu quero sempre ter um filho com minha mulher.
Publicado no jornal Zero Hora
Porto Alegre (RS), Edição N° 17626
6 comentários:
Surpreendente como está cada dia mais intenso e verdadeiro!
Como não Carpinejar...?
Como não Carpinejar...?
nice abstrack
"A ansiedade no amar alivia a alma." parabéns carpinejar, cada dia mais absoluto.
Me arrepiei com o texto. Simplesmente perfeito!
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