Arte de Leonor Fini
Fingir felicidade é mais amargo do que a tristeza. Um veneno para almas sensíveis durante uma separação.
Fui numa festa na Woods, em Porto Alegre. Sertaneja e à fantasia, ou seja, com todos os ingredientes para me sentir deslocado. Não tinha como demonstrar euforia. Poderia rir com a boca, não com os olhos, que é o meu riso mais verdadeiro. Poderia rir como quem ri para tirar uma fotografia (obedecendo ao x), não como quem ri observando sua amada (admirando o y).
Entre gladiadoras, policiais, branca de neve e indígenas, o que mais vi foi noiva cadáver. Não se trata de uma fantasia, mas um estado de espírito, um matrimônio doentio com o lado escuro do amor.
Representavam mulheres recém separadas que forçavam a barra de sua alegria, estavam mais interessadas em se vingar do ex com fotos no instagram ou marcações no Facebook, estavam desesperadas procurando uma porta de incêndio da sua fossa com beijos fáceis ou sexo louco.
Falei com uma guria na escada, e ela terminou a relação há duas semanas. Falei com outra na frente do bar e ela encerrou um romance há um mês. Falei com mais uma fantasiada na fila do banheiro e ela lamentava o fim de seu namoro na semana passada. Entrei num camarote com cara de purgatório, penadas peladas. Aquela nudez proposital não me convencia. Os cílios postiços escondiam o caminho das lágrimas.
Elas não se movimentavam com a liberdade das palavras. Suas pulseiras brilhantes da casa noturna lembravam algemas de casos mal resolvidos. Ostentavam um contentamento fictício, que é diferente de ser feliz.
Não achariam ali sua solução, seu remédio. Tampouco desejavam trair o amor despedaçado, confinadas nas lembranças dos seus antigos pares. Por mais que rebolassem e se agachassem nas grades, o que se notava com nitidez é que berravam as músicas de dor de cotovelo. Conheciam vírgula por vírgula, como quem pede socorro. Eram mulheres casadas por dentro fingindo solteirice por fora.
No luto, o melhor é ficar em casa. O melhor é destruir um pote de sorvete e assistir a um filme romântico de pijama. O melhor é se tocar em segredo debaixo das cobertas, depois do choro. O melhor é não conferir o espelho e repetir os lamentos para os amigos. O melhor é desaparecer para se acostumar com o fim ou reencontrar o início.
Jamais se violentar socialmente buscando ser agradável. Jamais chamar vítimas para ocupar o próprio lugar. Jamais tripudiar o que aconteceu de errado com novos pretendentes.
Jamais trazer para perto quem não tem nada a ver com sua angústia.
Reparar, enquanto é tempo, que você ainda está contaminada, ainda está reagindo à separação, ainda quer provocar atenção do ex, ainda vem conversando com os problemas do passado.
Não se envolva com rapidez para aumentar a culpa: quantos corações você precisa destruir para refazer o seu?
O ímpeto de sair de qualquer jeito do sofrimento lhe fará sofrer muito mais.
Publicado no jornal Zero Hora
Revista Donna, p.40
Porto Alegre (RS), 26/04 /2015 Edição N°18144
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