terça-feira, 15 de setembro de 2015

UMA CASA NO CAMPO

Arte de Eduardo Nasi

Depois da liberdade sexual dos anos 60, estamos atingindo o tédio sexual. Nunca foi tão fácil transar. É um clique e temos à disposição em aplicativos pessoas interessadas e próximas.

Na web, há um acervo que poderia entreter os mais maníacos. Casas de swing são práticas corriqueiras. Nas baladas, é natural se envolver sem falar o nome. Hoje Édipo nunca saberia que estava se relacionando com sua mãe Jocasta.

Passará vergonha se não guarda chicote, venda, algemas e vibradores no criado-mundo. A privacidade é pública e ninguém mais se escandaliza com nada.

Perdeu a graça dizer expressões safadas no ouvido da mulher. Vadia, puta e cadela formam um repertório inofensivo. Não produz mais cócegas na imaginação. A imoralidade não desencadeia fantasias.

Somos meros animais satisfazendo as suas necessidades mais básicas. Não pensamos o sexo, renunciamos a elaboração de segredos e mistérios.

O que deve acontecer é uma volta ao conservadorismo. Logo mais nos comoveremos com as canelas e os cotovelos. Alimentaremos devaneios com a penugem loira dos braços, ou com a nuca arrepiada.

O que nos restará na cama é retornar ao romantismo, à poesia, às juras de vida a dois, ao cavalheirismo.

Como o erotismo representa a quebra do lugar-comum, a tendência é procurar o oposto dos nossos dias explícitos.

A atração estará residindo na intimidade. O respeito substituirá a falta de pudor.

“Com licença” e “por favor” servirão de preliminares.

Pornografia não seduzirá como antes. O que fará o outro gozar será a promessa de filhos.

- Me engravida!

O compromisso que assustava antes na cama poderá excitar. Verbalizar o desejo de uma casa no campo ou de uma velhice juntos apressará o prazer.

A monogamia dominará o discurso na cama.

- Você é só meu, não transarei com mais ninguém.

A brancura dos lençóis será o equivalente a de um altar.

- Me dê um filho!

E o homem não irá broxar. Pelo contrário, ele se enxergará eleito, exclusivo, único. A perspectiva de ser pai redobrará os seus movimentos.

Já vejo o apelo crescendo até o orgasmo:

- Me dê gêmeos!

- Me dê trigêmeos!

- Me dê quadrigêmeos!

E ambos soltarão gemidos ensandecidos e gritos sonhando com a residência cheia, de cercas brancas e jardim podado.






Crônica publicada no site Vida Breve
Colunista de quarta-feira 02/09/2015

3 comentários:

Luiza Versamore disse...

Hahaha! Sim!

Anônimo disse...

Ótimo texto, verbaliza meu pensamento. ... ou então onde vamos parar? Tem que regredir!!!!

Bia disse...

Eu me sinto super confortável, acho que cada ser deve seguir pelas suas vias.
Se o nudismo e sexo explicito é entendido e aceito pelo ser e praticado sem incomodar terceiros não vejo problema.