terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

MOTEL DE CACHORRO


Minha mulher decidiu que nossa cadela Cora teria filhotes. Ela finge que é uma pergunta, mas é uma decisão.

– Vamos cruzá-la com algum cachorro bonito?

Qualquer sim ou não de nossa parte jamais mudará o resto da história.

– Descobri um maltês passeando pelo bairro Moinhos de Vento, bem alegre, que tal?

Ela já havia recrutado o pretendente, falado com a dona, programado o namoro quando propôs o assunto para nossa família.

Eu não chamaria minha esposa de autoritária, eu a amo, o nome disso é liderança.

Cora não foi castrada e desfrutaria da chance de conhecer o príncipe de sua vida. Ou, pelo menos, experimentar um pouco de sexo para alimentar sua memória de janela e porta.

Ela sofre muito com os acessos de excitação. Diria que é um caso de dupla personalidade, um Cisne Negro em miniatura. Fica louca no cio, girando na ponta das patas. Seu pelo incha, espetado, poroso, como se todo o corpo fosse um interruptor da rua. Baba, a língua é de Gene Simmons, e transa com a cama rosa sem parar.

Coitada da cama acolchoada: agora furada e com a esponja saindo pelas quinas.

Scott seria a nova vítima da fúria predatória.

Ele apareceu em casa para uma experiência. O veterinário explicou que o enlace deve ser na residência da cadela. Uma das regras do flerte canino.

Eu me ralei. O apê recém montado transformava-se em motel de cachorro.

Brincalhão, fofinho, Scott contava com dois anos. Cora apresentava cinco. Se cada ano vale sete, os dois juntos correspondiam a um tórrido caso de um adolescente com uma balzaquiana.

Scott não se mostrava interessado em copular, e sim em brincar de chafariz. Mijou a sala 20 vezes. Cora subiu no sofá para escapar da irrigação da lavoura. Nem se tocaram. Chegamos à conclusão de que ela era uma cadela de família, certo que não daria no primeiro encontro.

No segundo dia, Scott não mudou a tática, Cora repetiu o isolamento do sofá e o tédio. O mesmo ocorreu no terceiro, quarto, quinto dia. Nenhuma montaria, cheirada, aproximação. Faltava química, biologia, matemática, física.

Cansados, sem pano seco para lavar o piso, abortaríamos a missão. Mas a esposa apanhou Cora fornicando com a caminha e chamou correndo Scott para aproveitar a libido em plena atividade.

Preparamos acepipes e deixamos os cachorros sozinhos na sala, à vontade, por uma hora.

Depois de um tempo, escutamos barulhos fogosos, latidos, gemidos.

Festejamos o fim da virgindade de Cora e a futura ninhada.

Ao espiar pela fresta, vimos Scott trepando com a cama da Cora, mordendo as almofadas, desesperado.

E Cora dormia no alto da cadeira, de camarote, bocejando com a ópera. Nem entre os cães funciona casamento arranjado.



Publicado no jornal Zero Hora
Coluna semanal, p. 2, 14/02/2012
Porto Alegre (RS), Edição N° 16979

10 comentários:

Janine S. disse...

kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk
realmente, a vida nao ta facil pra ngm kkk

Anônimo disse...

Excelente crônica, adorei!

Cristiane Luz disse...

Comigo aconteceu algo semelhante. Com pena da minha maltês, também virgem mas muito tarada pois estava sempre transando com minha perna(mesmo fora do cio)resolvi trazer um candidato aqui em casa para ver se apagava o fogo dela. Mas não tinha jeito, ela fugiu o tempo todo dele, eu tentei de tudo mas quando me deparei com os dois malteses, um em cada perna minha trepando, resolvi abortar a missão. Esses cachorros mimados criados como gente, como são os casos dos maltes e outras raças pequenas tem mais gosto pelo corpo do próprio dono do que seus semelhantes. A princesa continua virgem coitada, até castrei ela porque vi que ela nunca iria aceitar sexo com cachorro, e também porque a veterinária dela me disse que ela pararia com esse taradismo de querer minha perna, mas mesmo sem útero ela continua faminta por sexo. Não sei mais o que fazer pois minha perna virou objeto sexual diário da Princesa.

Dea Carvalho disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
anareis disse...

Querida(o) amiga(o). Estou fazendo uma Campanha de doações pra ajudar os jovens rapazes que estão internados no Centro de Recuperação de Dependentes Químicos onde meu filho está interno também.Lá tem jovens que chegam só com a roupa do corpo,abandonados pela família. Eles precisam de tudo:roupas masculinas,calçados,sabonetes,toalhas,pasta de dentes,escovas de dentes,de um freezer, Roupas de cama,alimentos. O centro de recuperação sobrevive de doações,são mais de 300 homens internos.Eles merecem uma chance. Quem puder me ajudar pode doar qualquer quantia no Banco do Brasil agência 1257-2 Conta 32882-0

Fê Iasi disse...

ei adorei teu texto! bjo!

Anônimo disse...

Muito bom!

Escena disse...

Autoritárias nunca! Mas sim, um dom para a liderança!
Estas são as mulheres heheh

Sei que meu elogio na vale nada entre tantos. Entretanto,
lá vai:
Adoreii o texto!!

d i L k i n H a disse...

Muito bom, que texto empolgante! A cada linha, o anseio pela próxima.
Espero um dia escrever dessa forma.

Um abraço.

Brise disse...

Brise