domingo, 4 de novembro de 2012

QUASE PERFEITO — Consultório sentimental de Carpinejar

VIUVEZ POR ALGUÉM VIVO
Arte por De Chirico

“Tive um relacionamento que começou em 2004 e terminou em 2011. Foram muitas idas e vindas, quase enlouqueci. Terapias, remédios, emagrecimento e distúrbio hormonal fizeram parte da minha vida. No último término, decidi ficar bem, deixar a vida me levar, mas não está sendo fácil. Engordei dez quilos, me sinto cada dia mais infeliz. No próximo mês, faz um ano que estou solteira. Conheci pessoas que me fizeram balançar e se uma delas quisesse me levar a sério eu não estaria tão mal. Mas o amor esta banalizado, o carinho e o respeito com o próximo não existem mais. Abraços! Jane”

Querida Jane,
 
Você é fiel ao relacionamento mesmo separada.
 
Não se permite trair o seu marido. Incorporou a personalidade dele a ponto de não saber mais qual é a própria.
 
É como viuvez de alguém que está vivo por aí. Não arranja ninguém porque não tolera a ideia de que o outro possa ser melhor e ocupar a majestade da ausência. Não aceita ter sofrido em vão por um sujeito que não merecia, então perdura o sofrimento para glorificar a perda (uma dívida feita somente de juros).
 
Quando um homem se aproxima, já arruma uma série de desculpas para evitar intimidade.
 
Ou porque é indiferente ou porque é grosseiro ou porque é apressado ou porque não tem bom hálito ou porque palita os dentes.
 
Nossa, é exigência em demasia. Não há como ser aprovado no concurso público de seu coração.
 
Permanece sabotando interessados sem perceber. É um boicote involuntário. Sempre encontra algum defeito no próximo pretendente, sempre acha alguma falha imperdoável que impede a relação, sempre cria restrições para não se apaixonar.
 
Não sai para valer, cria júris. É capaz de perdoar todos os problemas de personalidade do ex, mas jamais admitir qualquer escorregão de quem se aproxima.
 
A questão é que não pretende superar o luto. Transforma a ruptura na pior fase de sua vida (nem terapia, remédio, lugares diferentes, nada aplacou a vontade de reatar). Há um exagero emocional em seu depoimento: “quase enlouqueci, engordei dez quilos, quero sumir”.
 
É como se quisesse provar que tentou tudo e fracassou, que o amor antigo é mais forte do que sua força de vontade.

Mentira! Sequer batalhou um pouco, não começou a se arriscar, não abandonou o altar fúnebre, não largou a data do término. Vem contando os dias do divórcio tal viciado enumerando a abstinência. Desde o princípio, não enxerga a solteirice de forma positiva.

Censura sua felicidade. Prefere sofrer o conhecido a experimentar uma alegria inesperada.

Publicado no jornal Zero Hora
Coluna semanal, Caderno Donna, p. 6
Porto Alegre (RS), 04/11/2012 Edição N° 17243
Preservamos a identidade do remetente com nome fictício.

10 comentários:

Anônimo disse...

É bem assim mesmo, parece que não queremos deixar ir só pra provar pra nos mesmas que foi real, com a certeza de era o certo, era ele, a gente prefere não admitir pras amigas, pra irmã, pra o mundo que estavamos erradas, porque só depois de ler isso aqui eu percebi. Eu estava errada, eu ainda estou errada, mas agora eu sei que posso tentar de verdade. Ahh de verdade, sem fantaSmas, sem datas, sem perspectiva de passado, amando o futuro e os
presentesentes que ele - o futuro - irá me dar. Muito Obrigada pelas palavras. E boa sorte pra minha amiga aí - que tenha a coragem boa de se deixar surprender pelo novo!Beijos, e sou sua fã, confesso que fiquei triste quando mudou de amor, Carpi, mas agora eu entendi não existe um só par perfeito, existem quantos a gente deixar que existam. Toda a sorte do mundo pra vocês! =D

Patrícia Marques disse...

Oi Caripnejar!
Adoro o que você escreve. Parece que diz aquilo que não conseguimos dizer. Me identifiquei c o título deste post. Também estou viúva de alguém vivo, e bem vivo, feliz e saltitante por aí. Queria mandar uma carta p você, para qual endereço mando? Preciso de um conselho sentimental também.

Sorte para nossa amiga acima, q ela consiga optar por voltar a viver. Isso q ela está tendo não é vida, é sobrevida. Q ela dê vida aos seus dias. Ela merece!

Abraços!

Anônimo disse...

Intensamente: verdadeiro!

Ve disse...

Caríssimo Carpinejar!

Adoro ler seus textos!! Sou sua fã!! Muitas vezes voce me compreende melhor do que eu mesma...rsrs!

Parabéns e obrigada por nos presentear sempre em seu blog com uma boa e prazerosa leitura!

Bjs!

GABRIELA disse...

É tudo tão verdade que chega a doer...mas o que fazr depois disso? Como se permitir novamente?

ana disse...

Cara Jane, tenha paciencia, só faz um ano que está solteira e foi um relacionamento de 7 anos...Geralmente demora-se a metade do tempo em que estivemos apaixonadas para esquecer um amor, entao no seu caso ainda falta mais dois anos e meio. Enquanto isso, vai se preparando para o outro, faça um bom regime, algum esporte, para estar bem bonita para o próximo. Quando voce estiver bem distraída cuidando de si mesma, o amor vai acontecer de novo.

Ela disse...

amo ler você!

Anônimo disse...

Muito bom o texto! Já fui viuva de alguém vivo. Mas, a diferença é que eu nunca me deixei entristecer. Sempre aproveitei minha vida, conheci novas pessoas, lugares, mas sempre coloquei defeito nos novos pretendentes. E a unica coisa que eu te digo é que abra seu coração para novos amores. Quando eu decidi abrir meu coração, ter um relacionamento sério novamente fui contemplada com um amor melhor do que puder imaginar, e hoje posso dizer que sou muito feliz e nada se compara a voce ter uma pessoa cuidado de vc, te amando do que viver nesse velório.

Anônimo disse...

se tivesse escrito pra mim, não seria mais perfeito....

Tô acendendo a última vela de 7 dias aqui, vou "beber o morto" e sair pra luta.

Bjos

ganhar dinheiro disse...

parabens pelo belissimo blog, acompanho o mesmo desde 2010, recomendo a muitas pessoas. Parabens