terça-feira, 21 de junho de 2016

CASA DA SOGRA

A operadora telefônica não parava de ligar.

O telefone vivia ocupado. Milagrosamente, entre uma conversa e outra, a sogra colocou rapidamente o fone no gancho e, sem nenhum trinado, no mais completo silêncio, escutou uma voz do além, um timbre plangente do outro lado:

– Alô, alô, senhora Clara, senhora Clara? Não desligue. Pode falar agora?

– Pronto! Sim, sou eu. Posso falar. Quem é?

– É da operadora de sua linha. A conversa será gravada. O número do protocolo é 458438. Gostaria que repetisse?

– Não. O que deseja?

– Mudar o plano da senhora.

– Mas o plano é ótimo: ilimitado. Não preciso mudar.

– Mas, senhora, é um plano antigo.

– Estou satisfeita, muito obrigada, não pretendo mudar nada.

– Senhora Clara?

– Sim!

– A senhora não entendeu, nós desejamos mudar. A operadora deseja mudar. A senhora usou 9 mil minutos no último mês no aparelho fixo.

– Tudo isso? Então estou aproveitando.

– Sim, só que está nos trazendo prejuízo.

– Que horror se dirigir assim a um cliente.

– Senhora, não desligue, por favor, raciocine comigo: a senhora usou 9 mil minutos de 44 mil. É um recorde, não tem precedente.

– Nem falo muito, as minhas amigas é que me telefonam na maioria das vezes.

– Não, senhora, com todo o respeito, um comitê de 30 teleoperadores foi escalado numa operação chamada de "Fidel Castro" para lhe ligar ao mesmo tempo porque ninguém conseguia a linha desocupada.

A força-tarefa durou 20 dias, das 8h às 22h, sem cessar...

– Pois é, será que a linha estava com algum problema?

– Não minha senhora, o problema é a senhora, a senhora é o nosso problema.

– Não pode falar comigo desse jeito. E não gosto de Fidel Castro, é um ditador. Por que logo Fidel Castro?

– Os discursos dele são intermináveis, senhora.

– Preciso desligar, alguém pode estar querendo falar comigo.

– Senhora Clara, tenha compaixão da operadora. Você fica quase cinco horas em média por dia no telefone. Não há nenhum parâmetro igual no mercado. Oferecemos um celular grátis em troca, qualquer aparelho, que pode ser retirado em nossas lojas.

– Não gosto também de celular. Prefiro a privacidade doméstica.

– Senhora, o que podemos propor para demovê-la do plano? Está excessivamente oneroso.

– Uai, meu plano não é ilimitado?

– Estou buscando explicar que até o que é ilimitado tem limites.

– Passe bem, tenho mais coisas a resolver do que perder o meu tempo no telefone.

Publicado em Zero Hora
Coluna Semanal publicada em 21.06.2016

Um comentário:

Anônimo disse...

Ecaaaa!