segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

COUVERT FAMILIAR

Arte de Basquiat


Todo pai deve se preparar para o vexame. Um dia seu filho terá uma banda de rock.

A formação do grupo é meteórica, inexplicável como sua dissolução. Não se planeja uma banda, acontece, como um beijo, uma fofoca, um suspiro. Ou porque seu guri está entediado e não tem nada a fazer ou porque é ambicioso e corre atrás de tudo que pode ser feito.

O ato é banal como criar um blog e aderir a uma rede social. Talvez nem seja informado, acabou o tempo em que conversar com o pai era coisa séria, antes a criança preparava o terreno com a mãe, avisava o assunto com antecedência, reservava o escritório.

Descobriu a novidade por acaso, ao assistir um vídeo no YouTube. Demorou a reconhecer o filho, que balançava os cabelos como uma vassoura, mas identificou a própria cama e também as cuecas samba-canção, queimadas num estranho protesto do quarteto a favor das baleias. Será um golpe duro, não tinha consciência de que seu filho tocava ou cantava. Nem o filho sabia.

Se você pensava que havia terminado o martírio das exibições escolares; se você dava graças a Deus pelo fim do ciclo dos teletubbies, dos bichinhos da parmalat, dos bananas de pijama; se você comentava que não havia coisa pior do que aplaudir 15 turmas com coreografias exatamente iguais; se você não aguentava o enxoval das fantasias, os ensaios que tomavam os finais de semana e exigiam caronas para cima e para baixo; se você se enxergava livre da obrigação de filmar cada cena e brigar a cotoveladas com o conselho inteiro de pais e mestres pelo melhor ângulo junto ao palco; se você confiava que não passaria mais pela humilhação de mentir na saída que foi lindo e emocionante e deu um basta ao constrangimento de suportar três horas de pé esperando uma ponta de cinco minutos; se você jurava que não ouviria mais nenhum sermão de diretor profetizando que o futuro é das crianças; se você já se sentia um veterano de guerra, disposto a empinar o peito com as medalhas; se você já entrava com a papelada da aposentadoria, comece a mudar de ideia: seu adolescente é roqueiro.

Deprimente é ouvir como se chama a banda dele, sempre uma nomeação esdrúxula a indicar rebeldia. Grande chance de ser alguma doença venérea: Gonorreia, Sífilis, Herpes. Sorte grande se ficar no corredor dos detergentes e for Diabo Verde ou Pinho Sol.

Na terapia, o que lamentará mesmo é ter brigado com a esposa pelo nome do filho.




Publicado no jornal Zero Hora

Segundo Caderno, coluna quinzenal, p. 3, 31/01/2011
Porto Alegre (RS), Edição N° 16597

11 comentários:

ANGELICA LINS disse...

Olha, eu ri demais...Haja terapia viu!

Anônimo disse...

Ser pai é padecer... As vezes no Paraíso. Outras, sabe Deus onde! rs

http://omundoparachamardemeu.blogspot.com/

Anônimo disse...

Uma banda de rock é tudo de bom!
A rapaziada jovem tem mais é que fazer muito barulho mesmo, e os pais devem embarcar nessa e curtir também. ahaha

Cíntia Rodrigues disse...

rsrsrs adorei ... Abs

Caca disse...

Com a primeira filha eu já ultrapassei a fase desse risco. Mas ainda tem a segunda, meu Deus!!! hehehe! Muito bom! Abraços. Paz e bem.

Magnólia Ramos disse...

O pai pode ter conhecimento do tamanho da criatividade do seu filho a partir do nome que ele "escolheu" pra nomear a tal banda, e de acordo com o nome a vergonha será maior ou menor.
XD

Anônimo disse...

Prezado

Poderia ser pior, ele poderia ter um blog...

Saudações Coloradas

Ivi Medau disse...

Guardou a sensibilidade na gaveta antes de escrever este texto, Fabrício?

Um beijo, querido!

TÂNIA CAVALHEIRO disse...

Aff...detesto comentários anônimos!
Pra quem achou que não houve sensibilidade no texto, acho que não entendeu...

Meu caçuça tem uma banda de rock...adoro!
E claro que vou lá me acotovelar e aplaudo feito adolecente tiete.
Só não entendi ainda o nome da banda... Mas tô tentando, hehehe...
PARABÉNS pela crônica, ADOREI!

M. disse...

Ótima crônica, engraçadíssima! Parabéns, Fabrício.
Mas há o lado bom de tudo isso... Antes uma banda de rock do que uma desses gêneros novos e um tanto "estranhos" que estão surgindo com a nova geração, da qual eu inclusive faço parte, mas essa já é outra história.

Margareth disse...

O universo musical percorre todos os ambientes, alegrando e agradando a todos com seus diferentes gêneros exibindo ramos de simpatias, gingos e molejos com direito a verdades e
romantismos, convidando o corpo e a alma falarem através da dança. Pra isso se faz necessário a presença de banda que unem e reúnem amigos e instrumentos para lutarem pela mesma causa: Música e divertimento, para alegra o nosso viver. Fabrício como fala o dito popular, jovem é outro papo. Eles têm o seu mundo que se renova com o passar dos tempos. O que todos querem é viver e com direito a liberdade. Comparo a liberdade dos adolescentes com a inocência das crianças. Vivem sem medo de ser feliz, faz as coisas sem pensar nas conseqüências. Até porque eles não querem perder nenhuma parte da sua história. E o rock é apenas um musical apressado e barulhento que agrada os adolescentes e os poucos que já passaram dessa fase. Como pais e/ou responsáveis o que nos resta é aceitar e ficar em estado de alerta, para os possíveis desvios de condutas. Cada um tem seus meio para compreenderem a vida. O que vale nessa vida é ser feliz e com musica então, é melhor ainda.

Margareth.