Os 23 mil sepeenses sabem que o que chegar aos ouvidos de Mateus irá adiante. Talvez por isso mesmo ele seja um confidente tão requisitado. Foto de Jean Schwarz
Fofoca é melhor do que notícia: corre mais rápido e aumenta com o tempo.
Sem um grande boateiro, a cidade do Interior não sobrevive. Ele é uma figura central para preservar a cadeia emocional dos acontecimentos e proteger a verdade dos interesses pessoais.
São Sepé, município a 259 quilômetros da Capital, tem um surpreendente porta-voz dos cochichos no portão e dos sussurros na janela. E não é uma mulher e ainda é jovem.
Sua frase preferida é:
ADIVINHA O QUE ACONTECEU?
A população de 23 mil habitantes não resiste à sua lábia.
Mateus Friedrich Barreto, 20 anos, estudante de jornalismo e estagiário da Câmara Municipal de Vereadores jura que não conta para ninguém o que escuta. Mas não acredite. Ocupa o dia inteiro espalhando as últimas pelas redes sociais, praças e restaurantes.
É o maior fofoqueiro da paróquia. Até os taxistas invejam seus mexericos.
É por ele que o morador sabe quem está grávida, quem traiu quem, quem brigou, quem foi demitido, quem chorou.
A simpatia e a aparência ingênua desarmam qualquer crítica e alimentam a reincidência das confissões.
– Por mais que a gente tenha noção de que sua natureza é passar adiante, voltamos a nos confidenciar com ele porque é um amigo que tem prazer de nos ouvir – afirma a jornalista Camila Gonçalves, 25 anos.
Mateus se tornou um especialista dos bastidores, araponga emocional. Tem uma legislação própria. Não inventa em cima dos fatos, recusa ironia e sarcasmo que distorcem o comentário e descarta maledicências (intriga e picuinha) de gente que pretende se beneficiar da destruição de reputações.
– Meu papel é ajudar os tímidos a se expor, jamais ferrar alguém – graceja.
Ele aliou o sistema presencial (participar de rodas de chimarrão, sentar na varanda, conversar em supermercado e ter fofoqueiros filiais em cada bairro) com instrumentos virtuais de mensagens (Twitter, Facebook, Orkut e Foursquare).
Sua vocação reivindica exclusividade. Ele frequenta as festas de aniversário, bate o cartão em coquetéis e cerimônias oficiais, espia a movimentação de bares e cafés. Sua língua ferina não poupa ninguém, das autoridades aos colegas:
– Só o morto tem vida privada.
A receita de sucesso é largar uma novidade e não tocar mais no assunto. Uma pedrada certeira para o círculo de voz crescer até o infinito. O bom fofoqueiro planta a semente e some, não fica se vangloriando da descoberta.
A recompensa do trabalho é ouvir de volta, como se fosse novo, algo que ele mesmo espalhou:
– Alegria mesmo quando uma fofoca retorna e quem me conta não tem ideia de que fui eu a origem de tudo.
O apego pelo ti-ti-ti veio desde a infância, ao perceber que os familiares somente prestavam atenção nele quando abusava do suspense.
Mateus é um falso gago. Demora a falar de propósito, mostrando dúvida e hesitação. Finge que é um segredo para aumentar a curiosidade da vítima e fisgá-la para dentro da correnteza das histórias.
– Não sou mentiroso, sou exagerado, dramático, ansioso – explica.
Está convencido de que todo fofoqueiro é filho da cozinha.
A fome nunca mente. Os escândalos podem ser feitos no quarto, mas é na mesa que eles aparecem.
Publicado no jornal Zero Hora
Série semanal BELEZA INTERIOR
(Em todos sábados de 2011, apresentarei meu olhar diferenciado sobre as cidades, as pessoas e os costumes do RS)
p. 30, 14/05/2011
Porto Alegre, Edição N° 16700
Veja confissão de Mateus, assumindo sua condição de fofoqueiro
5 comentários:
Você é demais! Que inveja...
Adoreiiiiiiiiiii... perfect!
Se ele tiver ambições políticas tem todas as chances de se tornar prefeito da cidade. Quem (de rabo preso) vai ousar não votar num cara desses? E, quem (que quer ver alguém importante de rabo preso) também não votaria nele para alcançar seus objetivos? hahahah! Muito boa, Carpinejar! Abraços. Paz e bem.
Senhores, vou lançar meu cd mÊs que vem. Quem quizer ouvir algumas canções, é só entrar no blog:
http://felipecyntrao.blogspot.com/
Quem dera se todo fofoqueiro fosse como ele.
Postar um comentário