Arte de Eduardo Nasi
No avião, uma passageira ao meu lado soltava gritos histéricos a cada turbulência.
Eu não me perturbei, não fui influenciado pelo seu medo: não me importava se fosse cair ou não.
No estádio, houve princípio de confusão, não corri para a saída. Permaneci tranquilo em meu degrau, não me importava se fosse me machucar ou não.
Se sou assaltado, devo virar os ombros. Se sou ameaçado, devo virar as costas. Não tenho receio das consequências.
Aceito absolutamente os riscos. A morte não me desagrada, a vida não me inquieta.
Não há vontade de me matar, muito menos de acordar.
Após a separação, não sofro de pressa nenhuma para concluir meus trabalhos. Não reclamo dos prazos. Não quero terminar logo uma palestra. Não apresso a porta de casa. Não defino um motivo para sair ou regressar. Um domingo lindo e uma segunda-feira chuvosa não guardam diferença. O altar vazio é igual a uma prateleira.
Não me preocupo com a minha saúde, ou com a aparência.
Na última sexta, dirigi de Porto Alegre até Caxias do Sul. Assim que atravessei o pedágio, voltei. Só precisava ir para longe e não parar nunca.
Pretendo cansar meu sofrimento. Rezo para desmaiar, e pensar menos.
Antes economizava tempo, reduzia as estadas nos hotéis, a duração dos voos, os afazeres, para ficar com ela. Agora o intervalo é inútil e minhas mãos são jornais de ontem.
Estou curiosamente tranquilo. O desespero me tranquiliza. O desespero me torna invencível. A expectativa é nula e, portanto, duradoura.
Voltei a ser humilde, a escutar as canetas, as moedas, os objetos caindo no chão e recolhê-los aos seus donos desajeitados.
A fossa me corrige a postura. Tenho falado baixo, peço licença às cadeiras e desculpa às paredes. Nunca andei tão educado, comedido, respondo imediatamente as ligações maternas.
A fossa devolve a modéstia. Você pode ser arrogante, mas o sofrimento amoroso rompe com a vaidade, fere a estima, sangra seu egoísmo.
Passa a se interessar pelos conselhos de todos, do síndico ao caixa do banco. Passa a andar devagar pelo bairro, enxerga cartomantes nos postes e beijos nos carros parados.
Não existe imunidade. Não tem como se defender da saudade.
O fim do amor é um retrocesso ambicioso. Não vai se valer da cautela. Não vai se apoiar na fama. Não vai fugir do desastre.
Você pode ser um empresário afortunado e rastejar para que alguém volte.
Você pode ser um ator de sucesso e mendigar uma segunda chance.
Você pode ser um engenheiro frio e indiferente e mergulhar numa crise de choro sem precedentes.
O amor é o antídoto da soberba. Maestros retomam o papel de solistas. Professores reiniciam seu percurso como alunos. Senadores se candidatam a vereador.
Aquele que se julgava pronto não tem mais nada fazendo sentido e precisa de tudo de novo.
Tudo de novo. Tudo de novo. Tudo de novo.
Eu não me perturbei, não fui influenciado pelo seu medo: não me importava se fosse cair ou não.
No estádio, houve princípio de confusão, não corri para a saída. Permaneci tranquilo em meu degrau, não me importava se fosse me machucar ou não.
Se sou assaltado, devo virar os ombros. Se sou ameaçado, devo virar as costas. Não tenho receio das consequências.
Aceito absolutamente os riscos. A morte não me desagrada, a vida não me inquieta.
Não há vontade de me matar, muito menos de acordar.
Após a separação, não sofro de pressa nenhuma para concluir meus trabalhos. Não reclamo dos prazos. Não quero terminar logo uma palestra. Não apresso a porta de casa. Não defino um motivo para sair ou regressar. Um domingo lindo e uma segunda-feira chuvosa não guardam diferença. O altar vazio é igual a uma prateleira.
Não me preocupo com a minha saúde, ou com a aparência.
Na última sexta, dirigi de Porto Alegre até Caxias do Sul. Assim que atravessei o pedágio, voltei. Só precisava ir para longe e não parar nunca.
Pretendo cansar meu sofrimento. Rezo para desmaiar, e pensar menos.
Antes economizava tempo, reduzia as estadas nos hotéis, a duração dos voos, os afazeres, para ficar com ela. Agora o intervalo é inútil e minhas mãos são jornais de ontem.
Estou curiosamente tranquilo. O desespero me tranquiliza. O desespero me torna invencível. A expectativa é nula e, portanto, duradoura.
Voltei a ser humilde, a escutar as canetas, as moedas, os objetos caindo no chão e recolhê-los aos seus donos desajeitados.
A fossa me corrige a postura. Tenho falado baixo, peço licença às cadeiras e desculpa às paredes. Nunca andei tão educado, comedido, respondo imediatamente as ligações maternas.
A fossa devolve a modéstia. Você pode ser arrogante, mas o sofrimento amoroso rompe com a vaidade, fere a estima, sangra seu egoísmo.
Passa a se interessar pelos conselhos de todos, do síndico ao caixa do banco. Passa a andar devagar pelo bairro, enxerga cartomantes nos postes e beijos nos carros parados.
Não existe imunidade. Não tem como se defender da saudade.
O fim do amor é um retrocesso ambicioso. Não vai se valer da cautela. Não vai se apoiar na fama. Não vai fugir do desastre.
Você pode ser um empresário afortunado e rastejar para que alguém volte.
Você pode ser um ator de sucesso e mendigar uma segunda chance.
Você pode ser um engenheiro frio e indiferente e mergulhar numa crise de choro sem precedentes.
O amor é o antídoto da soberba. Maestros retomam o papel de solistas. Professores reiniciam seu percurso como alunos. Senadores se candidatam a vereador.
Aquele que se julgava pronto não tem mais nada fazendo sentido e precisa de tudo de novo.
Tudo de novo. Tudo de novo. Tudo de novo.
Crônica publicada no site Vida Breve
Colunista de quarta-feira
33 comentários:
Meu Deus...como você está sofrendo...sofremos todos com você, acredite. FORÇA. ACREDITE OU FINJA, PELO MENOS QUE ISSO TUDO VAI PASSAR. DE TANTO FINGIR VOCÊ ACABARÁ ACREDITANDO...Minha solidariedade.
Postado no http://www.updateordie.com/
Uma música romântica que fala aquilo é real. Simples e direto. E por isso mais bacana que qualquer outra música romântica dos últimos tempos.
Se não aparecer com legendas, clique na barra inferior lado direito.
http://www.youtube.com/watch?v=nnlU0m1PlFY&feature=player_embedded
Perfeito! Simplesmente perfeito!
Sofro contigo...sofro do mesmo mal. Me identifico tanto que parece lendo meu coração, como se acompanhasse meus dias vazios.
Também me identifiquei ... Sofremos, mas vai passar!
Texto maravilhoso. Como sempre. Foi um prazer te conhecer pessoalmente ontem. Uma honra aprender com você. Beijo grande. Ana Luiza
Me identifiquei muito,muito mesmo! Mas preciso te dizer que talvez esteja deprimido,não aquela depressão de toda gente,mas aquela que necessita de química para sair. Acredite,se for o caso,sua tristeza só vai piorar,sério! Procure um médico para tirar a dúvida. Não quero perder você. É decepcionante, eu sei,mas muitas vezes a diferença entre estar aqui ou se deixar morrer é puramente fruto de um desequilíbrio na química cerebral. Volte já daí porque esse buraco não tem fundo para se chegar. Beijo!
Fantástico esse texto!! Me vi em cada estrofe.
Sencacional!! PARABÉNS!
Quando vejo uma postagem sua, das atuais, hesito em clicar, em ler. Já sei que vai me causar algo, choro, principalmente.
Você é sensacional; obrigada.
Adorei a música, Malu. :)
O amor nos torna frágeis. Mas nāo estou preocupada, os poetas sempre sobrevivem.
Lindo demais!!! É isso mesmo.
...pode parecer "separação", mas o que você descreveu é quase uma "iluminação"...
Apenas isso. É como se tivesse sido escrito por mim.
Me sinto bem assim agora. Espero ter alguém pra me ressuscitar
Você não sofre de amor, mas de egocentrismo hiperbólico, não admite que a palavra final seja dada por outra pessoa, ainda que tenhas provocado tal desfecho. É o oposto do altruísmo, usa a pretensa dor para alcançar mais e mais popularidade e aplausos. Não é crítica, é só uma constatação. Faz parte do teu show, e tem quem goste.
AUTOPSICOGRAFIA
O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.
E os que lêem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm.
E assim nas calhas de roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama coração.
Fernando Pessoa
Caro Carpinejar, boa viagem!
Enquanto o sofrimento aguça a sensibilidade, o luto evidencia para nós o que é essencial. Uma pena é que, quando tudo vai bem, geralmente estamos cegos. Belo texto. Parabéns!
eu posso te dizer que estou igualzinha ao campineira e mesmo tomando antidepressivo e fazendo psicoterapia não consigo parar de chorar e não consigo mais encontrar razões que me façam sair deste estado de inércia. Queria muito minha vida de volta.
Eu também espero.
eu continuo te amando meu muso, aceite se casar comigo, sou a estranha dos seus sonhos.
Só posso dizer que me lembrei que nunca gastei tanta gasolina do que na época do término do meu relacionamento ...horas e horas guiando , guiando , guiando para lugar nenhum , até cansar e tentar dormir direito .
Tenha calma e espere o tempo passar.Só resta isso mesmo!
Leia " Livro da Dor e do Amor", do psicanalista Juan D. Nasio. Ajudou-me muito a entender e livrar-me dum processo de perda doído demais...
Boa sorte!
Abç
Mari
O amor nos faz tão bem quando recíproco, mas assim como o nosso chocolate preferido também acaba um dia, por inúmeros fatores, às vezes tão bobos e banais, que parecemos idiotas. Se há chances de reconstituir a obra, temos que tentar, não podemos deixar acabar como se nunca tivesse existido, até porque é muito cansativo e difícil achar um novo amor, tão bom quanto o anterior...
Beijo
Nao faz mais isto contigo e com a gente. Não chore por quem não te merece. És emoção, ela razão. És abstrato, ela concreto. És humanas, ela exatas.
Muita força. Andrea Ribeiro
Você não precisa de antidepressivo. Está em luto. E luto dói. Dói pra caramba, mas é luto. Tampouco sofre de egocentrismo. Separação dói no ego mesmo. Você é só mais um dos tantos que choram por amor, pela separação, pela saudade do tempo vivido e pela perda do tempo que achou que ainda iria viver a dois. É só mais um, repito, mas com uma qualidade fenomenal de colocar em palavras o que todos sentem. É sua função de poeta, de filósofo, de sofredor. Obrigado pelo texto.
Mais que bandida!!!
tudo passa!!!
leia essa matéria da super interessante, espero que ajude.
http://super.abril.com.br/ciencia/amor-fim-566660.shtml
Leu?
Como lhe falei hoje na feira de Caxias, este texto é simplesmente maravilhoso. Força Carpi!
Também me sinto sem chão... Mas te desejo força! Bjos
parabens pelo belissimo blog, acompanho o mesmo desde 2010, recomendo a muitas pessoas. Parabens
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