MALABARISTA DE MOTÉIS
Arte de Picasso
“Tenho 30 anos, sou casado há seis com a mãe de dois garotinhos; namoro há três com uma mulher linda e, no momento, estou altamente balançado por uma advogada grávida de gêmeos. Estou sem saber o que faço. Meu casamento, meu namoro e o novo lance. Às vezes penso em internação. Algo do tipo: viciado em mulher para tratamento por 90 dias. Também penso que este sou eu e ponto final. Abraço forte! Roberto”
Querido Roberto,
Não se interessa em se aprofundar num relacionamento, mas conciliar vidas diferentes e mostrar que é capaz de cuidar de um harém como ninguém. Quanto maior a dificuldade e desencontro de horários, mais poderoso e viril você se sente. Um malabarista de motéis. Um executivo da intimidade.
O jeito que conta sua história não é triste, como se fosse um problema ou uma tragédia a resolver. Por baixo dos panos, elogia a própria versatilidade, o método de organização, a disciplina dos segredos, o aproveitamento do tempo.
Descreve sua rotina de três mulheres com descarado orgulho, com a naturalidade de um sultão. Não está pedindo um conselho, mas se vangloriando do excesso de opções, notou?
É óbvio que está completamente equivocado, e nem um pouco ressentido e disposto a alterar sua natureza compulsiva.
Recomenda sua internação de brincadeira, adotando o status de viciado em sexo. Algo como “me interna, não tenho conserto, sou mulherengo”. Está desligado do que as namoradas vêm pensando ou sofrendo. Não tem empatia com o dilema, crise de consciência, censura moral.
Vive na superfície, absolutamente desinteressado das notícias do fundo e de suas reais intenções. É uma superioridade que esconde fraquezas e medos.
A onipotência é um traveco. Você apresenta um lado feminino excessivamente acentuado que tenta abafar com um excesso de macheza. A caricatura disfarça a delicadeza dos traços.
Eu queria ver se fosse contigo. Se fosse traído pela sua esposa e cuidasse dos dois filhos enquanto ela se divertia com o outro, ou se fosse o pai dos gêmeos da amante que procura diversão com um terceiro.
Este é você, vírgula.
Publicado no jornal Zero Hora
Coluna semanal, Caderno Donna, p. 6
Porto Alegre (RS), 11/11/2012 Edição N° 17250
Preservamos a identidade do remetente com nome fictício.
Coluna semanal, Caderno Donna, p. 6
Porto Alegre (RS), 11/11/2012 Edição N° 17250
Preservamos a identidade do remetente com nome fictício.
12 comentários:
Bem isso mesmo Fabro, c matou a charada de homens assim.
Bendito seja este escritor.
"Isto é você", muitas vírgulas!
E Deus nos livre de homens assim.
FABRÍCIO, com essa resposta você só confirma meu AMOR (sim, não pode ser outra coisa) pelos seus textos.
Cara, sou seu leitor há 09 anos.
Quero dizer que essa reposta foi LINDA !
Deu porrada sem bater.
Abraço.
Leo Daflon
Fabro, um dia você me escreveu: "as pessoas mais escutam o que querem do que tentam entender o que realmente estão ouvindo" A despeito de você ter dito magnificamente tudo e mais (para além de todas as vírgulas, o "querido Roberto" ouvirá apenas o que quer. Ela acha que é ponto final sem saber que faz dos três relacionamentos reticências...
abraços
Há que se distanciar da realidade para entender o surrealismo existente neste pedido de orientação. Talvez mestre Yoda ou o Miagi pudessem dar lições como "use a força" ou "encere pra esquerda" mas, você, querido escritor, usou da mesma metáfora e ensinou a viver sem dizer uma palavra. Este é você (VÍRGULA) foi perfeito. Cafajestes nascem, crescem e morrem. Homens de família FICAM PARA SEMPRE NAS BOAS MEMÓRIAS. A escolha é de cada um. Eu escolhi meu caminho, sem VÍRGULAS. Abraços deste leitor assíduo.
TOMA!
Eu teria outra palavra pra descrever esse texto, que não fosse PERFEIÇÃO? Com uma frase do cara apenas, você foi no fundo da alma dele e disse o que talvez ele mais precisasse ouvir em toda sua vida! Não existe terapia que supere um texto como este, claro, objetivo, que foi ao centro da questão sem rodeios... e ponto final. E ponto para Fabrício Carpinejar, mais uma vez, pois ele não só é capaz de escrever textos brilhantes, mas também de "ler pessoas" com a maior naturalidade e precisão!
Deus me livre de homens assim ! CRUZES ! Mandou seu texto para cá só para se vangloriar infinitamente! Mereceu. Talvez uma internação fosse uma boa pedida !
The best ! sua resposta foi a mais linda como citou o Leo Daflon: Deu porrada sem bater.
Abraço apertado,
Adélia
parabens pelo belissimo blog, acompanho o mesmo desde 2010, recomendo a muitas pessoas. Parabens
Teria vergonha de dizer que esse homem é meu pai, se fosse um caso.
Por outro lado, ficaria felicíssima se ele pegasse uma doença.
Não tenho paciência para mau-caratismo.
Amei tua resposta!
Bjs cariocas
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