sexta-feira, 22 de fevereiro de 2019

O CONCURSO DO AMOR

Em dicas de vestibular e concursos, recebi a clara recomendação de descartar as questões mais simples para depois resolver as mais difíceis.

Nunca deu certo. Assim que começava uma prova, as mais fáceis pareciam também difíceis. Batia um pânico na porta de meus olhos. Não conseguia eliminar nenhuma das perguntas simples para ganhar preciosos minutos e enfrentar as soluções dispendiosas. Eu me debatia pela quebra do planejamento. Mordia a caneta, mastigava o lápis, tirava nacos da borracha.

Há quem, diferentemente dos conselhos dos professores, segue a ordem cronológica da prova para não enlouquecer com o que vem pela frente.

Comigo apenas funcionou a receita de iniciar pelas perguntas mais espinhosas e depois resolver as mais básicas. Encaro o que não sei para em seguida desenrolar o que entendo. Aproveito a tranquilidade do cronômetro para refletir demoradamente em uma saída para as charadas e ciladas.

Na vida pessoal, segui idêntico processo. Eu me preocupei bem mais em ter sucesso no amor do que na profissão. Mesmo que isso significasse ser reprovado pela soma dos pontos.

Eu me lancei na missão de achar a minha cara-metade. Não tive nenhuma outra prioridade. Mantive a consciência de que me quebraria, de que erraria, de que choraria, de que superaria vexames e desilusões, de que me arrependeria das certezas e me enervaria com as dúvidas.

O que entendi desde sempre: é preciso estudar para amar. Não é algo que se nasce conhecendo. Você experimentará pessoas, fórmulas e crises para definir o seu repouso. Passará madrugadas lendo os pensamentos e avaliando o instinto. Não se acertará de primeira. Dependerá de rascunhos e recomeços.

Ser amado e amar é a operação mais complexa da existência, a mais assustadora. Não é tarefa superficial localizar alguém para casar nesse mundão, compatível, com cumplicidade para atravessar as tormentas e generosidade para transformar a banalidade da rotina em alegria. Exige a nossa maior concentração. Há grandes chances de não encontrar ou se desencontrar do grande amor de sua biografia. Ou de deixar a folha em branco aguardando uma melhor hora.

Após responder à questão amorosa, todas as demais se tornam mais singelas e desembaraçadas. O êxito na carreira vem como consequência, os filhos serão resultado da convivência harmoniosa.

Quando Beatriz disse que ficava feliz não fazendo nada ao meu lado, eu poderia finalmente ser tudo. Não existe declaração de felicidade mais imponente para se ouvir.

O tempo agora está a meu favor para seguir com o exame.

Publicado em Jornal Zero Hora em 23/01/2018

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