terça-feira, 10 de junho de 2014

OLHA O PASSARINHO!

Arte de Georges Grosz

Grandes homens em grandes momentos terão algo em comum: a braguilha aberta.

Vi uma fotografia antiga do técnico Rubens Minelli na decisão do Brasileiro de 1975, quando o Inter ganhou de 1 a 0 do Cruzeiro com o gol iluminado de Figueroa. Ele gesticulava na frente da casamata do Beira-Rio, másculo e viril, a poucos instantes de se tornar campeão nacional, perto da glória da faixa no peito. Estaria perfeito para a posteridade se não fosse sua braguilha escancarada.

Lula tomou posse de braguilha aberta. Obama assumiu também de braguilha aberta. Paul McCartney cansou de cantar Yesterday com a braguilha aberta.

A braguilha aberta é a infância masculina, sua incurável distração. Pode ser um estadista, decidir o destino da humanidade, mas não se lembrará de levantar o zíper. De Napoleão ao príncipe Charles, é uma incompetência do homem. Um desleixo da heterossexualidade.

Não é maldade, não é sem-vergonhice, é um problema de software. Homem que é homem despreza a função do zíper. Aceita a convivência com cadarços e botões, e só. Papas e padres usam batina de propósito, somente para não oferecer mau exemplo.

As mulheres acreditam que seja resultado de nossa pressa. Pois não é. Se contássemos com todo o tempo do mundo, ainda assim esqueceríamos a braguilha aberta.

Não é que a gente foi ao banheiro, mijou e não subiu o zíper. A gente foi ao banheiro com o zíper baixo e o manteve do mesmo jeito. Não mexemos nele desde que saímos de casa.

Calça é cueca. Calça tem corpo fechado para os varões. Não recebe cuidado e controle diurnos. Botamos a calça de manhã e resolvemos o assunto até de noite – não somos adeptos da manutenção, ato exclusivamente feminino, feito da reposição do perfume e do retoque do cabelo e da maquiagem.

Eu fiz minha primeira comunhão de braguilha aberta, eu me formei de braguilha aberta. Em todas as cenas importantes de minha vida, lá está o fecho solto.

Antes de sair de casa, minha mulher decretou um checklist: limpar as remelas dos olhos, tirar as meias das barras da calça e fechar o zíper.

Ela tem a esperança de que vou alcançar a excelência, ou aquilo que chama de decência. Já penso em adotar o abrigo como meu traje oficial.





Publicado no jornal Zero Hora
Coluna semanal, p. 24,  10/6/2014
Porto Alegre (RS), Edição N° 
17824

Um comentário:

DONILDONIL disse...

Muito oportuno o artigo. Seria pura ficção se verdade não fosse! Verdade também é que só não consigo manter a sina da braguilha aberta porque a deusa que comigo vive, vive patrulhando as grades onde preso fica o safadinho. . . .