quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

SUPERMERCADO E AS MULHERES

Arte de Cínthya Verri


Sofro resistência de supermercado. Sou um cardiopata daqueles corredores gigantescos e intermináveis.

Não é que não goste, é que demora, sempre há uma dúvida de preço, de produto, de promoção. Só revisar a validade de cada produto posto no carrinho é uma trabalheira.

Quando minha mulher diz que é rápido, sei que vamos acampar na seção de frutas.

Nem comento sobre o caixa, o fim do rolo, a ausência de um código, a digitação errada de um preço que depende de um supervisor para ser corrigida.

Não é a Lei de Murphy que me apavora, é a constatação de que não desfruto de talento para a coisa.

Conservo o vício de armazém, feito para as urgências. É da infância o registro sonoro: vá ali comprar um pacote de feijão, um azeite, um saco de arroz, um refrigerante. Miudezas que completam a despensa. Naquele instante em que todo atraso estragará o ponto da comida.

Volto em cinco minutinhos. Não é necessário enfrentar congestionamento na garagem, filas, esbarrões, são cem metros livres e desimpedidos.

O super é um outro negócio. Afora o cansaço físico, temos que lidar com a onipotência feminina de querer lembrar tudo de que precisa em casa.

Mulher não faz mercado, é um balanço de firma, uma partilha de bens. Desde o nascimento, está preparada para o Juízo Final. Homem não é maduro para o apocalipse, não saberá escolher uma reles lembrança para justificar a salvação de sua alma.

Para elas, o supermercado é uma arte. São marchands das embalagens. Procuram a perfeição; aliar técnica e intuição. Acho que pretendem superar a mãe introjetada, e não dar a mínima chance para sogra. Não buscam correr. Há uma diferença entre se preparar e apressar. Elas se preparam para o ato. Valorizam o ritual, reparar, comparar, comentar novidades, é regra começar a andança pelo setor predileto para terminar por aquele que menos agrada.

Esquecer um item é um pecado, esquecer dois é um desastre. Demoram a noite inteira reclamando e se mortificando da falha. Têm um aproveitamento de 98%, mas não se aquietam.

O mercado deve ter sido a praça da infância. O parque de diversão. Ficam tão à vontade que consomem aquilo que estão comprando. É uma relação atávica de criança, a fome faz parte da motricidade: andar de balanço e comer pipoca, andar de gangorra e comer algodão doce.

Cínthya escolhe as uvas, pesa e vai degustando uma por uma até o fim enquanto passeia pelos corredores. Depois toma um pacote de salgadinhos e esvazia antes da esteira rolante.

Mulher come no mercado porque está em casa. É o único lugar em que não falta nada.



Crônica publicada no site Vida Breve

32 comentários:

Vívian de Castro disse...

Muito bom!

Luciana disse...

Pela primeira vez discordei completamente do seu texto...a mulher moderna odeia mercado, coloca o marido no seu lugar, que bem ensinado compra as coisas corretas, ou a empregada, que depois de uma década de insistência aprende. Só compramos as coisas práticas, de microondas, e verduras orgânicas q são bem mais fáceis de lavar. Tenha ceteza, que odiamos perder tempo no mercado, e nem olhamos mt para a embalagem!

Tania Aires disse...

Rsrsrs! Vc é o máximo!

Fátima Nascimento disse...

Carpinejar, não gosto de ir em supermercado (mas não chega a ser um sofrimento). A questão é que levo mais tempo dentro dele do que gostaria. E quanto mais tempo, mais $$$.

Bacana a crônica. Um motivo aparentemente banal inspirou vc, cutucou seu talento.

Meu abraço.

Luana disse...

Adorei o texto! Acompanho diariamente o blog e sempre me surpreendo com tamanha sensibilidade.

Nilma Raquel disse...

Estou no time das que destestam e, por presente do destino, tenho um marido que adora... Ainda assim, muito boa a sua reflexão. Mas então, pede pra sua mulher ir sozinha, ofereça alguma recompensa em troca, que tal? Abs,

Fernanda Machado disse...

Infelizmente, ou felizmente, somos assim...
Meu marido sofre da mesma angustia que você, acho que qdo Deus tirou a costela de Adão para fazer Eva, levou com ela a paciencia para o Supermercado, a beleza de apreciar aqueles corredores enormes e sair satisfeita que conseguiu comprar tudo o que queria (nem sempre o que precisava)...

Luciano disse...

"...Homem não é maduro para o apocalipse, não saberá escolher uma reles lembrança para justificar a salvação de sua alma."

Muito bom! O texto todo, mas gostei particularmente com essa parte. Parabéns!

Anônimo disse...

Também sou do time das que não gostam de ir ao super-mercado; Mas, lá estando, é mesmo como você diz: Como, como e vou colocando os papeis no carrinho. E lá estando, e se com dinheiro a vontade, coisa que dificilmente acontece, saio a procurar coisa para comprar. Você tem razão as mulhere são assim mesmo. Sheridan

Iu. disse...

AMEI SEU TEXTO, NENHUMA NOVIDADE ATÉ ENTÃO, AMO TODOS... RS!
PORÉM, ELE ME SERVIU COMO UMA LUVA, SOU MULHER, MAS ODEIO IR AO SUPERMERCADO, O BOM É QUE MEU MARIDO AMA E COM ISSO DEIXO O TAL PRAZER A ELE.

BEIJOS!

Anônimo disse...

por que será que os gaúchos reclamam
tanto de suas mulheres e elogiam sempre
os amigos e os cavalos?

(Ewaldo Schleder)

Linda Simões disse...

Ah!

Nem mais!

rsrsrsrs

...

Lua Barbosa disse...

Sou mulher. Não tão mulher como tantas (não sei se a maioria), odeio salão, morro de preguiça de pintar as unhas, espero o cabelo desbotar e raiz crescer pra pintar de novo, não uso (não sei usar!) salto, uso short por baixo do vestido, tenhos cremes mas não lembro de passá-los... Adoro cozinhar, mas morro de preguiça. Não levo jeito pra costura. Tenho fobia social e síndrome do pânico, logo, evito o máximo ir ao mercado: vou quando não tem mais escapatória e faço tudo correndo e de malumor. Mas não pude evitar o risinho de canto, ao ler esse texto! Identifiquei tantas mulheres nele. Identifiquei as mulheres, sem si. Qualquer mulher. Seja mãe, filha, amiga, namorada, irmã. Qualquer mulher que seja mulher: que se equilibre num salto, que passe horas no salão, se lambuza de cremes... qualquer mulher que sabe o dom de ser mulher. Algumas o chamariam de machista, ao ler. "os tempos mudaram" Os tempos mudaram, os costumes mudaram, mas mulher, quando mulher, nunca deixa de ser.

Diário Virtual disse...

Eu adoro super! Adoro ir no Bourbon. Mulher que fala que não gosta de ir em super, eu desconfio. Depende do tipo de super ou hipermercado. Odeio o Big, odeio Nacional e seus amigos. Minha paixão é o Bourbon. Escolher o que vou levar, sem a angustia de pegar um tomate "meia boca" na hora de preparar alguma comida porque a fulana ou a ciclana escolheram por mim.
Eu trabalho, estudo, vou na academia, e adoro ir no Bourbon.
Que nem ontem, saí da tua palestra e não resisti a dar uma "espiadinha" pelos corredores do hipermercado.

;)

Unknown disse...

Sou do time das que não têm paciência e ainda exijo meu marido a tiracolo em todas as compras de supermercado. E sabe o que ouço dele? "Adoro ir ao supermercado com você!" haha
Talvez porque eu seja prática, não olho embalagem e só compro o necessário, nada fora da 'lista'. Mulher que é mulher faz lista antes de ir ao super...hehe

Rosane Uchikawa disse...

Acabo de crer que minha alma "supermercadista" é masculina... o-d-e-i-o fazer compras de supermercado ! Mas sei q boa parte das mulheres curtem esse programinha infernal ! Bom texto.

Loren disse...

Eu e meu marido vamos semanalmente e, apesar de não gostarmos, fazemos desta tarefa um momento de
diversão...ao final das compras sempre fazemos
um delicioso lanchinho.
Parabéns pelo texto,mt bom.

Margareth disse...

O supermercado é o amor do estomago. As compras é a declaração de amor, empurradas pelas mãos andando sobre as rodas das carestias, as quais são esquecidas pelas necessidades e pelos desejos. Tantos produtos para escolher, um antes da posse, escondido ente os dedos, sumindo na boca, vestígios na roupa, denuncia o flagrante. Vem gritando entre os corredores uma voz que fala para você (no plural, evitando a vergonha diante do constrangimento, o bom é que não te personaliza): senhores clientes, favor não abrir as embalagens no interior da loja. Quando não, um minuto depressivo te consome, culpando o medo dos fungos e bactérias, comi sem lavar. Posso adoecer. Ai meu Deus e agora? Vem às promessas, nunca mais faço isso. Só que o nunca, nunca é nunca, nunca não existe, pois o nunca sempre se repeti. Supermercado, que delicia de tema Fabrício, é o shopping dos doces e salgados, agrada a vista, entristece bolsos, bolsas, carteiras e cartões. Horas e horas se vão. Vamos as. Homens, mulheres. Compras. É a vida do consumo, é a vida do consumidor. Vale tudo, pelas delicias e prazeres.
Margareth.

Panul disse...

Puxa vida, detesto supermercado: achar um lugar no estacionamento,tirar coisas da prateleira,colocar no carrinho,tirar do carrinho,colocar no caixa,tirar do caixa,colocar nas sacolas, pegar as sacolas,colocar outra vez no carrinho, tirar do carrinho, colocar no carro,tirar do carro,colocar na cozinha,tirar das sacolas, colocar no armario/geladeira/etc...Aaaahhhhhh, detesto!

* mas adorei seu texto. Beijo.

www.odiariosecretodeumamariposa.blogspot.com
www.mulheresestrogenicas.blogspot.com

Robson Ribeiro disse...

Cara, eu não detesto supermercado, mas também não morro de amores. Vou até lá, compro as coisas e pronto. Sem maiores dramas. Minha ex é quem não gostava muito...

Pelos comentários, acho que nem todas as mulheres estão tão afinadas com o que você escreveu... hehe Mas de qualquer maneira é sempre um prazer ler suas crônicas.

Grande Abraço.

juliana disse...

Aqui em casa é o contrário, meu marido adora supermercado, fica horas lá dentro e eu prisioneira dele.
Te adoro Fabro!

Unknown disse...

Eu e o supermercado temos uma relaçao de amor e ódio. Às vezes, fico horas e acabo comprando noo máximo 5 itens, só pra poder pegar o caixa-rápido. Tenho pavor das filas! Outra coisa que me chateia é comprar mais do precisava. Gastar meu dinheiro todo com comida (e sempre coisas super calóricas) me faz chegar em casa arrependida do tempo perdido. Mas por outro lado, eu amo ir amo supermercado. Amo ver todas aquelas cores, sabores, cheiros...

ah, feminice...
uma praga!

Unknown disse...

Adoro supermercado, mas acho extremante cafona comer dentro de um.

Sizií disse...

Hummm.... acertou em cheiO rs... porem falta-me tempo pra passar horas necessariias dentro de um.

=D
Abraços'

@Taylguedes disse...

acertou!
em todos os detalhes possiveis!
é isso e é assim mesmo!
mulheres... somos seres complexos mesmo.. rsrsrrss

Dalva M. Ferreira disse...

Adooooooooooooooro supermercado. O dia que eu ganhar na megasena vou fazer uma compra quilométrica, matar todas as minhas fomes. Comprar "aqueles produtos", todos!

Bazófias e Discrepâncias de um certo diverso disse...

Fantastisch!

Poupée Amélie™ disse...

Me senti em casa! Adoro supermercado!

Anônimo disse...

Hehehehehe! Impressionante! O relato fatídico de uma realidade feminina!
Adorei!
Déia

Sol Costa disse...

Ah, eu sou do time do supermercado sim! Adoro! Fico na ansiedade esperando o dia de fazer a feira. Passo dez vezes em cada corredor para ter a certeza de que não esqueci nada. Aprecio cada item, os que compro e os que não me dou o luxo de comprar. Fico feliz quando chego em casa e abro uma cervejinha pra ir tomando enquanto arrumo as compras e aprecio mais uma vez cada produto. Depois ligo pra minha mãe, conto o que comprei e volto pra cozinha pra começar a comer tudo porque mais do que supermercado, adoro cozinhar!

jana disse...

Amooo ir no super, ficar passeando de gôndola em gôndola, pesquisar preços..enfim é meu deleite!!!

Isadora disse...

Pelos comentários cada vez mais o perfil feminino vem fugindo do estereotipo e temos mulheres menos "mulherzinhas". Também odeio mercado mas parece obra do acaso onde os opostos se atraem...sempre que me preparo pra enfrentar meu inimigo esqueco algum item importante e so lembro dele depois que a arda batalha ja foi vencida e ja estou em casa...ele sempre tem direito a revanche a contra gosto...mas esses dias encotrei um site q vem me ajudando a adiar cada vez mais nosso embate - www.mandapracasa.com.br ...fiz um carrinho de compras...escolhi quando quero receber cada produto...agora mercado so vem fazendo parte da minha vida nos dias de inverno quando vou comprar uma sopinha fresquinha!