sexta-feira, 1 de março de 2019

SEM PERSEGUIÇÃO

Acabou a relação, você não pode mais sair correndo atrás da mulher. Perdeu o privilégio do perdão pelos abusos cometidos dentro do romantismo.

Não há como diferenciar o que é desespero da perseguição.

Antes tinha como se mostrar arrependido, mandar flores, telefonar incessantemente e fazer vigília na frente do prédio dela. Agora a coragem é enfrentar a solidão e o fim.

Se ela diz que acabou, a negativa deve ser protegida acima da dor de corno e de cotovelo. Mesmo que ela esteja enganada, mesmo que seja um equívoco, mesmo que ela jogue fora o amor da vida, mesmo que a ruptura seja fruto de uma mentira, há de admitir que nada pode ser feito, para o bem da relação. Engula a injustiça a seco.

A loucura pode reestabelecer o amor enquanto ainda estão juntos. Depois, não funciona. Unicamente a serenidade trará alguém de volta.

Mulher odeia pressão, e a entende como invasão de privacidade, violência e cerceamento da liberdade.

Será visto como um louco, um psicopata, um desequilibrado. Confirmará tudo o que ela já pensa de pior a seu respeito, trará provas definitivas para justificar a separação.

Nenhum mal estar se resolve pela coerção, apenas aumenta a angústia dos prazos e o ambiente de guerra. Ela se distanciou porque não conseguiram mais conversar, portanto não existirá magia imediata que lhe devolva a legitimidade da voz. Só o tempo recupera os ouvidos do amor.

Não dá para romper o silêncio pela ansiedade. Não dá para mandar uma avalanche de WhatsApp. Não dá para falar com os familiares dela. Não dá para procurá-la em lugares públicos fingindo coincidência. Não dá para aparecer em seu emprego de repente.

Conceda férias para si mesmo. Só ela pode ir atrás, não você. Espere em casa, quietinho, comportado, sem escândalo, sem vitimização, sem fofocas mórbidas, sem greve de fome, sem bebedeira. Ela conhece o seu endereço.

Publicado em O Globo em 07/3/2018

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