terça-feira, 14 de agosto de 2012

TERRORISMO AMOROSO

Arte de Ernst Ludwig Kirchner

Meu amigo Pedro Borges saiu com uma mulher linda, inteligente, culta, maravilhosa, gostosa.

Perguntei:
— E aí, como foi?

Ele lamentou:
— Não aguentei tanta sinceridade.

— O que ela fez?
— Contou que estava com 37 anos e não podia esperar mais para ter um filho.

O colega gelou, e naturalmente desapareceu, sumiu, escapou pelos fundos do bar.

Sinceridade não assusta, o que assusta é a falta de jeito.

Falar que deseja um filho logo de saída não é sinceridade, mas atentado, terrorismo, assalto emocional.

Assim como anunciar que pretende casar de cara. Ou que agendou encontro para apresentar os pais no dia seguinte.

Qualquer pessoa normal não vai se envolver.

Amor não é carreira, o primeiro encontro não é entrevista de emprego onde confessamos nossas aspirações e metas.

O certo é conhecer, depois planejar.

Sinceridade não é dizer à toa, sem contexto, é aguardar o momento, o assunto, a deixa. Não é expor direto, quando está a fim, mas quando a outra pessoa também pode ouvir e entender.

É o encontro de duas vontades.

Sinceridade não é se livrar de nossos medos e falar o que vem à cabeça.

Não, o nome disso é precipitação.

É preguiça de se apresentar, de criar intimidade e de atravessar todo o caminho do pensamento. É procurar chegar sem viajar, desembarcar sem se deslocar.  É se livrar da tarefa da conversa.

Sinceridade mesmo é cuidar daquilo que se fala. Não atropelar as pessoas com as nossas idealizações.

Despejar nossa vontade não é sinceridade, mas pancadaria.

Mulher quer preliminar no sexo, homem quer preliminar na conversa.

5 comentários:

Moa Peraccini disse...


Fabrício, como sempre sua análise e descrição de um sentimento humano foram perfeitas.
Mais uma vez me identifiquei, porque sou uma pessoa sincera de nascença, nasci com essa virtude, felizmente. Digo felizmente porque aprendi à administrar a exposição das minhas verdades e vontades, de filtrá-las o mais humanamente possível, sem ferir as almas e mentes despreparadas para vozes e palavras desnudas, cruas.
Adoraria postar essa crônica no Facebook, mas não posso nesse momento, porque estou em processo mútuo de sedução e conquista com "uma mulher linda, inteligente, culta, maravilhosa e gostosa" que conheci ali.
Temo que expor esse texto pode deflagrar um mal entendido, como se estivesse dando uma indireta para ela se conter, pois ela também faz parte da turma partidária da sinceridade, apesar de saber que ela usa essa ferramenta com muita maestria e coerência e vai saber separar o joio do trigo, mas é melhor não arriscar em um momento tão delicado desse, não é?
Abraços e mais uma vez grato por compartilhar sua sabedoria de forma saborosa.

Núbia Camilo disse...

EU SOU uma terrorista emocional!
Que bondade, que deleite seus posts - às vezes em parceria com Cinthia. Cada dia uma gota de colírio a clarear um pouco mais esses olhos turvados pelos malogros do mundo. Obrigada.

Anônimo disse...

então!
eu tmbm sou extremamente sincera,franca,direta tdos os adjetivos que possa classificar como verdadeira, e as vezes eu acho que assusto sendo assim, já perdi algumas amizades, no relacionamento sou meio precipitada, ao mesmo tempo que eh ótimo ser assim, incomoda, pois mtos não estão preparados para receber a verdade, e no relacionamento, eu to na duvida, eu estou esperando uma nenem do meu namorado, e qndo engravidei falei para darmos um tempo e tal, mas agora estou louca pra falar, vamos ficar juntos e tdo mais, e assustar! q q faco?!

Vanessa disse...

Pode ser que ela não queria conhecer nem planejar nada com Pedro Borges.

Deborah Endelmann disse...

Bem, a sinceridade sempre assusta, e muito, todo aquele que se sabe em desvantagem...Passa a ser terrorismo emocional. Mas, todo aquele que , por ser deficiente em algo, faz uso deste argumento, isto é, qua a sinceridade deve ser usada com cautela e no momento certo é, justamente, aquele que está fazendo terrorismo emocional a seu favor. Percebeu? Intuiu?