segunda-feira, 16 de setembro de 2013

NAMORO MADURO

Fotos de Mauro Vieira

Vinham pelo Parque Harmonia de mãos dadas no meio de uma tarde de 30ºC. O bagual e sua prenda. À moda cavalheiresca.

Ele com lenço no bolso para limpar suor, ela com leque na bolsa para abanar o rosto.

Gente antiga vivendo emoções novas.

Era o grande evento do início do namoro: visitar os pavilhões do Acampamento Farroupilha.

Eles mal andavam, paravam para rir, acarinhar, alisar os cabelos um do outro. Um casal de adolescentes no banco de shopping não faria igual vexame de arrebatamento.

– Estamos nos pegando – brinca Nilva.

Ela beija a boca dele e rouba um riso. Ele ri e devolve o beijo.

Aníbal Cardoso, 68 anos, e Nilva Barbosa da Rocha, 70 anos, namoram há 15 dias. A velhice passou reto por eles.

– O tempo nem acenou para nós, nos esqueceu dentro da paixão – completa Aníbal.

Nilva tem dois casamentos e três filhos. Aníbal, por sua vez, tem no currículo um casamento e quatro filhos. Uniram as histórias e as famílias.

– Juntando nossa parentada, montamos um piquete – brinca Aníbal.

Apesar dos divórcios e das separações, não renunciaram à esperança de encontrar uma alma parecida (“já que alma gêmea é muita ambição”, explica Nilva). Não foram chatos ou complicados ou cerimoniosos, toparam na hora a aventura de se mostrar novamente e recomeçar relacionamentos.

Os dois vivem se provocando. Como cavalos xucros.

– Vamos ver se completamos bodas de ouro – diz Nilva.

– De prata está de ótimo tamanho, né mulher? – atenua Aníbal.

Não há limite para se apaixonar. A paixão remoça.

Ambos se conheceram em um baile no CTG Cabos e Soldados do bairro Partenon, entre galanteios e cortejos.

– Chamei Nilva para conversar, falei que ela era bonita e dançadeira. Ela estendeu o laço do vestido, perguntei se era solteira e se queria ficar com gaúcho que gosta de sapatear.

Nilva não negou o fogo dos saltos.

– O amor maduro é o ideal, temos o pé no chão para não pisar nos calos do companheiro, temos vida própria para não se desesperar de saudade – pontua Nilva.

– E não é o sexo da noite, da virada, louco, mas o sexo de sesta, pensado, com carinho e colo – finaliza Aníbal.

Sexo realmente é melhor com intimidade, e produz, de graça, cintilação nos olhos.

O par brilha sem querer. Caminha feliz na sombra dos eucaliptos, alheio à fumaça dos churrascos. Esbraseados pela cumplicidade. Nilva chama atenção de Aníbal.

– Tá de braguilha aberta!

– É mesmo, desculpa, não vi.

– Não é para Ele passear, só você.

– Também não sei porque coloquei fecho na bombacha, bombacha deve ser com botão. Isso que dá inovar.

A observação já é coisa de quem está casado há tempo.

Um pequeno ato falho entre tantos acertos juvenis.


Publicado no jornal Zero Hora
Coluna especial Farroupilha por um dia, p. 23
Porto Alegre (RS), 15/09/2013 Edição N° 17554

Um comentário:

Veninadeogum@gmail.com disse...

Obrigada uma boa leitura, a muito tempo não faço uma leitura de um livro.