domingo, 30 de dezembro de 2012

QUASE PERFEITO — Consultório sentimental de Carpinejar

TALIBÃ DO AMOR

Arte de Fatturi

“Estava namorando um cara havia quatro meses. Ele tinha no perfil dele 150 amigos, sendo que mais de 100 eram mulheres. De repente ele adicionou uma que comecei a perceber que não parava de segui-lo em todas as postagens. Tudo ela curtia, comentava e mandava beijos. Ele me disse que não a conhecia pessoalmente, tampouco falava com ela. Até que a adicionei, ela aceitou, conversamos por mensagem, e ela me contou que conversam sempre, mas não têm vínculo. Fiquei braba, pedi para ele excluí-la e ele não aceitou. Terminamos. Estou louca? Uma mulher dá em cima do meu namorado e ele não faz nada. Estou desnorteada. Um abraço, Rafaela.”

Querida Rafaela!
 
As rupturas acontecem por picuinhas. Por brigas tolas. Jamais por assuntos sérios e de interesse maior.
 
É um ciuminho que se transforma em intolerância, é uma descortesia ingênua de tarde que migra para a difamação ao final da noite.
 
Com os desentendimentos menores, não imaginamos que vamos nos separar e desprezamos as reservas. Atacamos com ênfase, despreocupados, e passamos dos limites.
 
Com as discussões sérias, antevemos a gravidade do encontro e cuidamos de uma por uma das palavras. Temos mais paciência e flexibilidade.
 
Julgo mais fácil se separar por não lavar a louça do que por infidelidade.
 
Vejo que você chamou atenção para a importância da amiga dele – de flerte alçado à ameaça.  Curiosamente toda mulher ou homem escolhe a sucessora ou o sucessor pelo ciúme. O ciúme faz a transferência da coroa e do cetro. Aponta quem é perigoso e com condições de ocupar o papel principal nos próximos capítulos da novela.
 
A amiga poderia se deleitar em ações platônicas: curtir, postar, comentar a página de seu namorado, desde que ficasse isolada na admiração. Seriam iniciativas inofensivas. O problema é que você não conteve a irritação e exagerou na dose. Quis mostrar quem mandava e contra-atacou. Nem pelo medo de perdê-lo, e sim para testar sua influência. O amor sempre fracassa quando vira disputa de poder. O amor é despoder, confiar e não cobrar provas. Pena que realizou o contrário, solicitando demonstrações visíveis de dependência e respostas imediatas.
 
Travou uma guerra extremista desnecessária: ou ela ou eu. Supervalorizou a figura dela, a ponto de colocá-la no mesmo patamar de intimidade. Pôs uma completa desconhecida como rival ao adicioná-la, trocar mensagens e xeretear possíveis laços.
 
Não está louca, tampouco está certa. A mulher deu em cima, porém excluir ou rejeitar um contato superficial é promovê-lo.
 
Também tomaria cuidado com as restrições que se assemelham falsamente a prevenções. Prevenir não é limitar, prevenir é conversar e aceitar a escolha do outro. Não devemos mandar ou ordenar em nome do amor.
 
Sua estratégia não foi inteligente. Se ele não cumprisse o que desejava, já não servia. Não tinha saída negociável, não gerou conscientização gradual e consistente, tratava-se de um ultimato.
 
No namoro, as proibições são insaciáveis e nada recomendáveis. É excluir nomes no Facebook, depois excluir nomes no celular, depois excluir nomes da lista de festa, depois excluir nomes entre os amigos, até que não exista mais ninguém para pedir colo e nos consolar pelo fim do namoro.

Publicado no jornal Zero Hora
Coluna semanal, Caderno Donna, p. 6
Porto Alegre (RS), 30/12/2012 Edição N° 17298
Preservamos a identidade do remetente com nome fictício.

11 comentários:

Thaís Herrera disse...

Gostei muito..do que li..acredito realmente muitas pessoas dizem que é amor,essa prisão emocional que criam em volta do parceiro..
Essa desculpa que é por "amor" que estão cuidando tentam aprisionar,ter o controle;num sentimento egoísta que nada se assemelha ao verdadeiro amor.

www.pedradosertao.blogspot.com disse...

Muito bem colocado, há poucas pessoas que trabalham o equilíbrio nas relações e precisamos educar as gerações para agir assim...porém, passei para desejar um 2013 bem diferente...além de paz, prosperidade e alegrias para nossos seguidores...meu desejo é que haja mais poesia para alegrar a vida!

Abraço do Pedra do Sertão

Anônimo disse...

Tive uma situação um pouco diferente desta, no meu caso, havia expressões como lindo e amor que me incomodavam. Um adjetivo comum usado entre a pessoa mas que para o "meu homem" incomodava-me muito. Fizemos acordo e usei a expressão e se fosse comigo que usassem essa expressão.
Quando conversamos e temos acordo, temos retorno, não proibi, não pedi pra excluir, pedi cuidado nas expressões, não pedi pra escolher ou eu ou ela, até porque se assim fizesse uma hora o feitiço viraria contra o feiticeiro e talvez eu não aceitaria.
Tudo conversa e negocia, se não há conversa, não há disposição para amar.

Cláudia Leister disse...

Gosto muito de Fabrício e, se não concordasse com a maioria de suas opiniões, não estaria aqui, a segui-lo. Neste caso, em especial, discordo dele. Na minha opinião, você está certa! Coberta de razão! Quem ama, se preserva naturalmente, sem que o outro precise apontar aquilo que deve ser evitado. Nem sei se é o caso de traição ou possibilidade de traição ou simplesmente pouca empatia quanto ao que o outro parceiro sente. Só acredito, por experiência própria, que não há paranoia, nem exagero, nem fantasia em ver o que não há... Apenas o gostar, que observa e cuida. Não pela obrigatoriedade do amor nem pelo controle do outro, mas pela atenção e pelo desejo de respeito e transparência.

ana disse...

Faço minhas as palavras de Aletheia. O amor não precisa cobrar nada quando é correspondido. É natural se preservar para o outro.

iris disse...

O problema está nos pré julgamentos, no pré conceito que fizemos e também na falta de confiança, hora se a pessoa está com vc está porq gosta, por livre arbítrio, aí consequentemente vem a confiança mútua.
Abraços.
PS. Adoro sua opinião Fabrício...

Anônimo disse...

Quando alguem quer estar comigo, simplesmente fica. Qdo namorava meu ex marido, ele no inicio guardava uma carta de amor na carteira e eu sabia, um dia ele me chamou e rasgou-a, dizendo que ja nao tinha importancia e ficamos casados, felizes, com uma filha, romanticos e cumplices por 18 anos.

Unknown disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Thiago disse...

Quem ama deleta.

Anônimo disse...

Adoro as cronicas do Carpinejar, mas dessa vez discordo do que ele aconselhou.
Manter um contato as escondidas parecendo que quer alguém para inflar o ego me parece uma mentira contada dentro da relação o que não vejo como algo natural. Se amar é não impor, creio que amar seja também transparência. Se esse contato do namorado não tivesse importância, as opiniões, curtidas e comentários também não deveriam ter e, como não se tratava de uma amiga, excluir é o melhor caminho.
Aceitar alguma coisa ou pessoa é renunciar a outra ou outras.

Concordo com o comentário da Aletheia, quem ama se preserva. Saber que meu namorado está sendo "cortejado" as escondidas e ele mesmo não impõe um fim a isso, exige que eu tome alguma atitude.

Unknown disse...

Concordo contigo, Carpinejar, quando tu recrimina a atitude dela de adicionar a outra e ir questioná-la, quando quem devia explicações era apenas e tão somente o namorado.
Uma vez (no tempo do orkut) vi que meu namorado usou uns bonequinhos (os chamados body poke) pra mandar um beijo à uma moça linda. Não comentei nada, até ele fazer uma ceninha de ciúmes injustificada. Só então questionei "porque eu tinha de dar explicações de coisas desnecessárias, enquanto ele se achava no direito de mandar beijos pra outra mulher." Ele, pego de surpresa, ficou sem ação. Envergonhado pediu desculpas, disse que ela era só irmã de um amigo e me pediu ajuda para apagar o tal beijo. Sem brigas e sem barracos, resolvemos a situação. Me preservei também em não ir atrás da garota, nem supervalorizar o fato.
Também não mexo no celular escondido, nem fico rastreando pra descobrir possíveis traições... Algumas irão me chamar de tapada, mas se pegar no pé resolvesse, as ciumentas não seriam cornas nunquinha. E a partir de observações minhas, parece que são as que mais levam!! E vice-versa...