sexta-feira, 15 de julho de 2016

COMBO-FAMÍLIA



Texto: Fabrício Carpinejar
Foto: Gilberto Perin

Com a recente transformação da estrutura familiar, hoje formada por madrastas, padrastos e meio-irmãos, e diante do rearranjo veloz de relacionamentos ao longo da vida, ficou comum a expressão arcar com o pacote.

Quando alguém casa com mulher ou homem com filhos de outros casamentos, logo fala aos amigos que terá que comprar o pacote inteiro.

Mesmo soando como uma manifestação de amor ("se eu não te amasse não assumia todo o pacote"), a frase tem um quê de pesar, um tom de incômodo. É, na verdade, uma confissão de sacrifício.

A declaração é infeliz pois sublinha o apesar, ressalta o desconto, enfatiza a restrição. O pacote é uma inevitabilidade forçada, aponta os malefícios do benefício.

As crianças são tratadas com uma conotação de contrariedade.

Não adianta elogiar a companhia cometendo uma crítica velada à paternidade ou à maternidade. Não adianta homenagear o namoro e atacar os filhos, compreendidos como um fardo e juros de antigos amores.

É necessário entender que o filho não é opcional, não se abandona o laço, é parte irreversível do caráter do pai e da mãe.

Na hipótese do pai e da mãe desprezarem as crias em nome de uma relação recente serão também péssimos amantes e cuidadores.

O natural é não falar nada, deixar as coisas acontecerem, permitir que a amizade nasça da espontaneidade e se fortaleça no decorrer do tempo.

Não há como gostar de alguém por antecipação, mas tampouco é justo desgostar prematuramente, que a rejeição não seja herança de condicionamentos culturais e preconceitos sumários com quem já tem um passado.

Recorrer à ideia de combo é anunciar nitidamente que está levando algo que se quer com algo que não se quer.

A gravidez desejada não acontece uma única vez na vida com os pais da criança, acontece sempre que se inicia uma nova família com os filhos já crescidos.

Publicado em O Jornal O Globo (blog)
15.07.2016
Coluna Semanal

Um comentário:

Maria Teresa Valente disse...

Realmente, Fabrício, é um incomodo que nos chateia.
Quando os parentes do outro falam: você não é obrigado a assumir os filhos dela, meu Deus se ele nem assumiu a paternidade dos filhos dele, alegando que não não colaborava por causa dos meus filhos, mas exigiu que meus filhos trabalhassem e entregassem o dinheiro pra ele.
Se me permite, posso publicar no blog www.teceramor.com , agradeço, abraços carinhosos
Maria Teresa