Arte de Eduardo Nasi
Namoravam no sofá. Ambos colegas de trabalho que resolveram se dar uma chance. Não havia nada a perder mesmo que errassem, pois um erro em comum já seria intimidade.
Mão para cá, mão para lá, beijos ensandecidos e, de repente, no calor máximo dos toques, ela trava:
- Será que estamos prontos?
Ele prosseguiu beijando e ignorando a questão.
Ela prosseguia cortando e jardinando os dedos e os avanços.
Ele resmungou que aquela pergunta tinha sentido no século XIX, não hoje.
Ela foi mais contundente:
- Vamos com calma! Sou uma mulher séria.
Austeridade e seriedade são duas palavras broxantes.
Ele, então, encolheu a respiração, esticou as calças e buscou algum assunto neutro para enganar a excitação. Perguntou o que significava o imenso quadro da sala.
- É um retrato sobre a ovulação, feito sob encomenda por um artista — meu amigo —Eduardo Nasi.
- Ovulação? Interessante…
Assim como era interessante a coleção de Pais & Filhos e Crescer debaixo da mesa, era interessante o carrinho de bebê desmontado no corredor, era interessante os bichinhos de pelúcia na estante.
A ida ao banheiro tornava-se providencial para se refazer. Quando não há sexo, haverá sempre a discussão por que não houve sexo. Necessitava se preparar para conversar sobre preliminares e formalidades.
- Ei, o toalete é na segunda porta – ela explicou.
Mas ele abriu a porta errada. Deparou-se com um quarto de criança digno de revista de decoração: berço com móbile balançando, abajur de estrelas refletindo no teto, paredes cor de rosa e armário abarrotado de roupinhas. Entretanto, não notou nenhum nenê dormindo.
- Você tem filho? Eu não sabia.
- Não tenho, é que já deixei tudo pronto antes de ficar grávida.
- Interessante…Interessante…
O homem somente emprega eufemismos, a exemplo do “interessante”, quando está em pânico.
Crônica publicada no site Vida Breve
Colunista de quarta-feira 12/08/2015
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