Quando a gente se separa não é para empenhar grandes planos, por mais tentadora que seja a ideia de fugir e desaparecer. Não é o momento para mudar de profissão e abandonar causas. Não é para realizar tudo o que não foi feito durante a relação, por vingança e recalque.
Trata-se de uma convalescença emocional, de silêncio forçado. Um período para se recuperar e não falar nada ainda para entender o que aconteceu.
É sobrevoar os hábitos com uma atenção mínima, flutuante, básica. Não há como se exigir muito. Basta se observar e ver como a dor se movimenta pela casa. Prepare um chá para a saudade e pergunte o que ela recorda. Lembranças agradáveis? Lembranças horríveis?
Qualquer decisão será adotada para combater uma ausência, nunca por vontade própria. É mais uma reação do que uma atitude consciente. É mais um recado a um terceiro, como demonstração de poder, do que a legitimidade pensada de uma opção.
Querendo mostrar o que a outra pessoa perdeu acabará também se perdendo.
Não se precipite a justificar o fim, mantenha-se longe das redes sociais. Versões contraditórias coexistirão em você por uns meses, vai odiar e amar alternadamente com grande facilidade.
Todo mundo que termina um namoro e um casamento tem pressa de ser feliz. Não há maior angústia do que a pressa de ser feliz. Não há maior desastre do que a ansiedade para desmanchar em alguns dias o que levou meses e anos para construir. No afã de dar a volta por cima, sempre cometerá bobagens que dificultam uma hipotética reconciliação ou um fortalecimento gradual da individualidade.
O amor é formado de tréguas . É fundamental uma pausa para se desintoxicar da convivência e reparar os defeitos.
Não saia viajando, não se tatue para oferecer indiretas, não acumule plásticas, não caia na gandaia, não prometa coisa alguma, não procure casinhos antigos, simplesmente aguarde o coração se acalmar. Parece um terremoto, mas é taquicardia.
Não elabore projetos solitários para arcar com o constrangimento de cancelar logo em seguida. Não exclua ninguém definitivamente de sua história até ter certeza, até o óbito da esperança.
Não banque a fortaleza inexpugnável. Não deixe de chorar quando bater a vontade. A fragilidade é exorcismo, é colocar para fora, previne ressentimentos e mágoas. Melhor sofrer de uma vez a maltratar a si em futuras relações.
O que é acertado por mero impulso não perdura. Investimentos numa ruptura atendem somente a uma compulsão de agradar e de se firmar, formarão dívidas reais e prejuízos morais.
Separar-se não é mudar, é a arte de se adaptar.
Publicado em O Globo em 17/01/2018
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