– O que você deseja comer antes da prova?
Assim como os condenados à pena de morte têm direito a escolher sua última refeição, a mãe criou um método pessoal de incentivo na superação de exames.
Em todo concurso, nas vinte e quatro horas anteriores à aplicação da prova, ela se prontificava a atender à minha súbita fantasia gastronômica.
Buscava me animar com um prato predileto e demonstrar que estava me apoiando no estudo. Formava uma manifestação silenciosa que surtia mais efeito do que os interrogatórios e frases de autoajuda.
Poderia responder uma extravagância que ela cumpriria. Poderia exigir comida vietnamita que caçaria os ingredientes no Mercado Público.
Ela surgia como um Aladim de avental. Eu desempenhava a tarefa fácil de esfregar a lâmpada e exigir o cardápio.
De manhãzinha, a mãe sumia para catar os itens. Voltava carregada de sacolas e receitas inesperadas. Arrumava a mesa com toalha de linho, abria uma exceção para o refrigerante e retirava os talheres da caixa de seu enxoval.
Na seletiva para técnico judiciário, optei por quibe frito. Recebi porções generosas com um sádico detalhe: unicamente destinadas para mim. Os irmãos me suportavam comendo e suspirando. Ainda oferecia um pedacinho para debochar. Não aceitavam por orgulho.
No concurso de escriturário do Banco do Brasil, solicitei feijoada. Na seleção de auxiliar administrativo, garanti bobó de camarão.
Desfrutei de almoços de imperador, refeições nababescas, luxos imperiais.
O que nunca contei para mãe é que ela, na ânsia de me ajudar, acabava me atrapalhando. Claro que comia demais, passava mal e jamais alcançava a classificação para a segunda etapa das provas.
Publicado em Vida Breve em 29/11/2017
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