segunda-feira, 15 de janeiro de 2018

UM CHICLETE NO SAPATO

A esposa descobriu que o marido era infiel pelo chiclete. Nem quis discutir. Quando viu o marido mascando sem parar por mais de uma semana, flagrou a traição. Não precisou de prova, de foto, de vídeo, de batom e blush na roupa, de mordida, de arranhão, de celular estranhamente desligado. Ela sumariamente dispensou o homem, sem direito a liminar. Como nos julgamentos sumários de guerra, que se parte direto para execução.

Ela conhecia muito bem o seu cônjuge (ideal é chamar de cônjuge que fica mais fácil se separar). Chegou próxima dele, anunciou e virou as costas:

- Você voltou a mascar chiclete. Desejo o divórcio. Pode arrumar as suas coisas.

Não era uma promessa que ele havia quebrado de nunca mais pôr uma goma na boca. É que o chiclete estava ligado ao período da paixão do casal. Quando começaram o relacionamento, ele inventou de confessar:

- Só tenho vontade de chiclete quando fico apaixonado.

Ela guardou a informação irrelevante por cinco anos. Manteve o áudio vivo na memória, para uso indefinido. Pois mulher não esquece nada nunca, cuidado com o que fala no início do namoro.

Ele revelou, na época, que usava o chiclete como isca dos beijos, para perfumar a boca e insuflar a atração. Jamais cogitou que estava dando um testemunho contra si a ser empregado no futuro.

Logo a esposa concluiu que ele se enrabichou por outra e se aventurava em motéis nas horas vagas. O chiclete não poderia ser uma homenagem ao matrimônio, já que ultimamente a relação se caracterizava pela distância e formalidade na cama.

O homem não muda as suas estratégias de sedução. Não se atualiza. Não faz reciclagem. Sempre será pego pela imensa previsibilidade de suas velhas armas.

Publicado em O Globo em 07/12/2017

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