segunda-feira, 15 de janeiro de 2018

UM CRUCIFIXO NO JARDIM

Um pouco de sofrimento dá saudade e pode apressar reconciliações. Uma colher de sopa de dor, não mais que isso.

Qualquer um aguenta um mês longe, inclusive dois meses, um constrangimento, um desentendimento sério, uma ausência muda de telefonemas e aparições.

Angústia breve é salutar, permite ajustes necessários na convivência, trazendo à tona exigências e reivindicações até então secretas. Uma briguinha não é ruim, revela o que não foi acertado no início, aumenta com a lupa as cláusulas minúsculas do contrato afetivo.

Já não deixe o seu amor sofrer demais, o risco da superdose é fatal. É necessário não passar do ponto, evitando de converter teorias dissonantes em grosserias e aviltamento da personalidade.

A generosidade do enamoramento tem o seu limite. Logo a distância perde o charme e expõe que, de repente, não vigora nenhuma aceitação e compatibilidade de gênios.

O sofrimento excessivo termina relacionamentos. O sofredor é capaz de realmente cansar de amar e não querer mais nada em seguida. Ficará vacinado para qualquer nova aproximação.

Não brinque com as esperanças e expectativas, não recue nas palavras, não apresente a todos amigos e familiares para remendar que não queria algo sério. A vergonha costuma não oferecer caminho de volta.

Quando as lembranças ruins superam as boas, quando o mal-estar abafa a paixão do começo, o namoro tem os seus laços quebrados. Quem pensa demais sempre vai se separar, já que a emoção tornou-se secundária. Pois daí é possível se defender racionalmente daquilo que não se gostou.

Depois de aguardar um pedido de desculpa por longo tempo inutilmente, não existe conserto. Arrependimento não deve ser demorado. Mesmo que o perdão venha, será atrasado e servirá para somente limpar a consciência, não lavar o amor. O outro não acreditará mais. O outro não suportará a ideia de passar pela mesma tormenta no futuro. Terá força para dizer não, de tantas negativas acumuladas dentro de si.

Separação é como esteio de uma planta jovem. A madeira de alicerce, se tremendamente pesada, encurvará o caule e se transformará em crucifixo de lápide no jardim.

Publicado em Donna ZH em 12/11/2017

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