quarta-feira, 30 de agosto de 2017

LIXEIRA DO WINDOWS

Foto: Gilberto Perin

Depois de dois anos de separação, é que o amor começa a ser superado. Não antes, por mais rápido que seja o relógio biológico e emocional de cada um.
Com o desenlace, o impulso é apagar todos os arquivos do relacionamento: imagens, cartas, textos, viagens, declarações. Trata-se de uma atitude passional e súbita para a sobrevivência, para se acostumar com a ausência dali por diante. Expulsa o romance mais do que realmente joga fora.
Mas o delicado de entender é que você apagou o passado dos aplicativos, mas ainda existe a lixeira do Windows do inconsciente. É preciso, então, entender o que aconteceu, para o seu bem ou para seu mal, e ter a coragem de descartar tudo de novo. O resto de tudo.
Jurava que já havia resolvido, porém vê que existe um purgatório da memória, assim como há em todo computador. Limpar a lixeira será o ato de libertação das mágoas. Quando está mais forte e com distanciamento crítico, para não sofrer com a preservação de relíquias duvidosas. Deixará de colocar em xeque as suas decisões, e de parar o olhar, atormentado, nas lembranças como se existisse um jeito de melhorá-las. Assumirá o que aconteceu como acontecido, o imperfeito como possível, o provisório como definitivo.
Não escolhe mais, apenas se desfaz. As palavras tornam-se fotografias inúteis.
Não terá mais a sensação de que está pondo você no lixo, ou parte da sua vida no lixo, aceitará que o fim é somente espaço para novas memórias.

Publicado em O Globo em 03/08/17

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