quinta-feira, 21 de março de 2019

SEM ESSA DE BANCAR A VÍTIMA

Se não declara o motivo do término da relação, você tem todo o direito de ser stalkeado. Não reclame dos arapongas e espiões, dos detetives e dos laranjas em sua vida. Fez jus - os juros das trapaças virão.

Feio não é stalkear, é não ter coragem de terminar cara a cara, com honestidade, explicando o que aconteceu.

Quem some e desaparece sem o mínimo de consideração de expor o porquê do desato, merece ser stalkeado. Merece investigação. Merece flagrantes. Merece fofoca. Merece o vexame das redes sociais, o atentado de ver o ex ali olhando tudo.

Não estou falando de agressões e maus-tratos, que somente reivindicam distância, mas de romances que ficam em aberto, insolúveis.

Não se esconde a verdade por muito tempo - ela sempre aparece nos momentos de distração.

Não mostrar é favorecer o cenário para o outro procurar e fuçar por sua conta e risco.

Seja limpo para evitar fakes e desconfianças. Seja didático no desenlace, não engane o antigo par, que já foi o seu lar. Conte a verdade, ainda que embaraçosa, conte que traiu, conte a deslealdade, conte que está apaixonado por uma nova pessoa. Conte, para não ver os seus méritos descontados depois.

Os que omitem uma justificativa certamente já estão com alguém. Não querem estragar a sua felicidade cuidando da dor da separação. Não explicar o desfecho é garantia de infidelidade.

O silêncio somente traz confusão, não existe história bonita na despedida, até o unicórnio tem chifre.

Arque com as consequências de seus atos, seja responsável. Não dizer é aumentar o sofrimento alheio, é estragar os segredos partilhados, é criar paranoia, é menosprezar a inteligência de sua antiga companhia, é desmerecer os momentos juntos, é despedaçar as chances dela em confiar no futuro.

Incomode-se com a discussão, com a choradeira, com as ofensas. Perca tempo para não perder todo o respeito. Tenha a decência de visitar e descrever tim-tim por tim-tim a sua mudança de comportamento e de planos. Enterre os sonhos de olhos abertos. Sem essa de buscar os pertences e os objetos quando não há ninguém em casa. Sem essa de pedir o que ficou nos cabides e no armário em caixinhas de papelão. Sem essa de mandar mensageiro com as alianças. Busque as suas coisas pessoalmente, com educação, conversando, perguntando o que pode ou não levar, pedindo desculpa. A humildade salva o caráter.

Todo mundo deve saber o que ocorreu para a ruptura do relacionamento. Não se começa do acaso, não se termina do acaso.

O fim tem que ter nome, sobrenome e endereço.

Publicado em O Globo em 01/6/2018 

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